Café Alexandrino - O lado aromático da vida

domingo, 24 de dezembro de 2017

Noite escura

Meus confrades já se foram todos
Partiram sem deixar nenhum bilhete.
Estou só, caminho a esmo,
Ao largo da consciência;
Na inconsciência,
Subescrevo-lhes.

Mário de Sá-Carneiro,
Querendo se aproximar da morte,
Buscou-a aos 26.
Rimbaud, aos 27.
Pessoa, hepatopata, não completou
A quinta década.
Vinícius, aos 66, dizem, 
Foi embora com edema de pulmão,
Mas se bem me lembro, foi de paixão.
Vininha não tinha dores,
Morreu de amores.

Vou deixando gota a gota
- um pouquinho de cada -
Essa ingrata vida dedicada.

Morro de amores, de paixão,
Falta-me o fôlego, a respiração.
Também estou doente das vísceras;
E me aproximo cada vez mais.

Em pouco tempo
Não mais ouvirão
Minhas batidas
Meu suspiro
Meus ais.

Ismael Alexandrino

Ao som de 'Aria - Suite para Orquestra N. 3' - Sebastian Bach
Degustando Queijo Grana Padano com Vinho Chateau Lê Pin


quinta-feira, 21 de dezembro de 2017

Flerte

Sorrateira tarde
Matreira tarde
Tarde...
Nunca é tarde.

Mão macia, fina
Inicialmente tímida
Lábios entre-abertos
Sorriso pelo meio.

Contemplo-te
- também tímido -
Pela veneziana
Dos meus olhos
Que falam demais.

San Marco inteira nos observa.

Absortos numa luz fugidia
Navegamos por canais exóticos
Contemplando enfeites eróticos
Nas vitrines de máscaras e muranos.

De ímpeto, versos me inundam
De total contentamento.

Entre vozes animadas, cantantes,
O silêncio nos fala
Mais que qualquer enciclopédia
Meramente teórica,
Retórica,
Estóica,
Que a virtude é suficiente
Para a felicidade.

Que os filósofos não me ouçam,
E não digo que a filosofia é vã.
Mas para um poeta,
A felicidade é realismo abstrato,
De sobressalto
Traslada pelos ares bascos
E repousa sonolenta
- porém paciente -
Além do Atlântico,
Algo ansiosa, expectante,
Bocejando lábios de mel,
Há algumas esquinas
Do Parc Guell.

Ismael Alexandrino

Ao som de 'Vivir sin aire' - Maná
Degustando um Chianti Clássico

domingo, 17 de dezembro de 2017

Irracionalismo

Mundo
Fundo
Fecundo
Iracundo
Todo mundo

Mundo
Rico
Fecundo 
Pobre
Odre Velho

Velho
Abismo
Fundo
Escapismo
Lacônico demais

Demais
Iracundo
Todo mundo
Sem nada
Profundo.

Ismael Alexandrino

Ao som de 'Fake plastic trees' - Radiohead
Degustando Cápsulas Gelatinosas de Cafeína






domingo, 10 de dezembro de 2017

Falésias de minh'alma


Mar revolto
Que atravessa o oceano
Chega cansado
Na encosta
Bate e volta
Ainda impetuoso
Ávido
Ofegante.

A encosta
Agredida durante milênios
Acolhe o mar
Com sabedoria
E o afaga,
Sussurrando-lhe
Conselhos sábios.

Quem vê de longe
Acha tudo belo,
Não vê as cicatrizes
daquele encontro,
Não percebe o gosto de sal
Que escorre nas lágrimas
Daquelas falésias.

Persiste em minha memória
- a despeito da eternidade -
O bom
e
O bem
Daquela cena.
E também a saudade.

Ismael Alexandrino


Ao som de 'Ameno' - Era
Degustando Café Nespresso Roma
Imagem: 'Falésias de minh'alma' - Ismael Alexandrino
Composição da imagem: Louças assinadas por Mana Bernardes sobre um livro com as obras de Salvador Dali, que traz na sua capa a tela "A Persistência da Memória", ícone do surrealismo.




quarta-feira, 29 de novembro de 2017

Bilhete para Deus

Dá-me, Senhor,
duas coisas
nada triviais:
sabedoria e humildade.
E, se puder,
um cafezinho
e alguns anos
a mais.

Ismael Alexandrino

Ao som de 'Aria' - Sebastian Bach
Degustando Água com gás Perrier

segunda-feira, 11 de setembro de 2017

"No" ar


Sopro divino
Vento terreno
Ora furacão
Ora mansidão
Desastre ao norte
Descanso ao sul.

E eu?

Sopro
Vento
Furacão
Mansidão
Desastre
Descanso
Catarse!
Calmaria.

Ismael Alexandrino

Ao som de 'Better together' - Jack Johnson
Degustando hidratante labial de cacau
Imagem: 'Regata Brasíli a- Ismael Alexandrino

quarta-feira, 6 de setembro de 2017

Beira-mar ou rio

Quando eu te via,
Cotovia,
Naqueles fins de tarde
Na via

Via na Viscondi
No sétimo
No quarto
Na via

Mão única
- à ocasião -
Não convergia.

Depois da migração
Para o frio,
Esfriou.
E esquentou,
Certa vez,
Nas margens frias
De um rio calado,
Discreto.

Quanta poesia mergulhou
Naquelas águas fugidias...
Quanto verso se afogou
Sem concluir uma estrofe...
E pingou dos olhos
Várias vezes
Emoção.

E passou-se o tempo
- sábio senhor -
Curando feridas
Sem propósito.
Feridas ingratas.

Gracejos, Cotovia,
Essência eterna de nós dois.
E cá estamos:
Verso, prosa e poesia.


Ismael Alexandrino

Ao som de 'Bring me to life' - Evanescense
Degustando Kebab

segunda-feira, 21 de agosto de 2017

Fim de tarde


Os olhos foram azuis-esverdeados.
Também foram pretos,
E até cor de mel.
Hoje não há olhos.
Sequer lembrança do olhar.
Há uma paisagem
Sorrateira
Estática
Bela
Lembrança vaga
Matreira
Que se esvai
E leva tudo
Com o arrebol.
E a noite
Que chega
Fria,
Escura,
Congela
E petrifica.
Preambula
Um renascimento.

Ismael Alexandrino


Ao som de 'Sunrise' - Norah Jones
Degustando Água sem Gás
Imagem: 'Sunset Life' - Ismael Alexandrino

domingo, 18 de junho de 2017

Transliteração

Transliteração

Meu velho pai...
Antes, tu eras prosa.
Hoje, em silêncio,
Poesia.

Ismael Alexandrino

Ao som de 'Quando a saudade dói' - Daniel
Degustando Arroz com Tomate

domingo, 5 de fevereiro de 2017

Pensando aqui...



Ismael me pediu um texto pro blog dele...


          "Viver e não ter a vergonha de ser feliz..."
Palavras tão fortes: VIVER, VERGONHA, FELIZ; E o que esperar delas? A resposta encontrará aqui. Hoje começo falando um pouco de mim.

          Na vida, independente de sua fase, fazemos escolhas. Sim, a vida é feita de escolhas, constantemente!

           Uma das minhas foi casar-me com uma luz, uma mulher de alma ímpar, que me trouxe muita alegria, companheirismo, energia, admiração e o maior presente que um homem pode ganhar: um filho! Nossa, quanta gratidão a ela, a Deus, à vida.

           Uma outra escolha que fiz na vida foi a de ser médico. Com uma proposta altruísta, cheio energia, de sonhos, de idéias, de desejos...

             Mas, assim como a vida, o casamento, a medicina e outras escolhas que fazemos, não são um filme Hollywoodiano: podem ser duros, pesados, corridos, sofridos, exigentes, mas sempre RECOMPENSADORES. Mas só o tempo te mostrará isso.

           Esse TEMPO é como o VIVER: é um evento único, mas é forte, infalível em sua missão, contínuo, perene, que molda, que derruba, que levanta, que dissipa, que apaga, que escreve, que passa mas que também fica. Loucura esse tal tempo, esse tal viver!

        Sim ele é forte porque ninguém o segura, quer tentar para-lo? É perene, pois ele nunca some, está aí, sempre do seu lado. Ele molda, porque vemos a pedra bruta ficar lisa, mostrar-se polida. Ele derruba para dar espaço a mais vida, para que algo novo germine, cresça e dê a cara da sua beleza sobre aquele pedacinho antes apático. Ele levanta porque é da poeira que se edifica!

         E esse mesmo tempo, com essas mesmas características moldou o meu ser, o meu viver. Foi e será ele o meu grande companheiro e desafiador nessa jornada terrena. Com ele estou aprendendo a ser forte, corajoso, ser mais eu, sem VERGONHA, sem vergonha de ser feliz. Não que eu não fraqueje às vezes. Por vezes a bateria do relógio acaba. Opa! Mas o tempo não para!

          Pois é, por alguns instantes o relógio parou essa semana pra mim, mas o tempo é soberano e infalível, ele segue... Depois o relógio que se ajuste ou que o ajustem.

            Interromper aquilo que Deus criou, a VIDA, é incompreensível! - Concordo! A questão é que num momento de tristeza, de desespero, cada um pede ajuda do seu modo, que vai do olhar ao gritar! O meu foi bem sutil, sublime, diria, fatalmente, insuficiente! Sempre aprendemos!

             Mas fica sempre a curiosidade alheia da motivação: seria suficiente? Para quem está sofrendo sempre é, pergunte nos momentos mais desesperadores e a resposta será: Sim! Mas para quem os cerca é incompreensível e inadmissível! E claro que é incompreensível mesmo, entendo bem.

Já estive do lado de fora também, na ocasião da perda de um grande amigo que partiu desse plano sem ao menos um adeus, como doeu. Hoje desejo que Deus, a Luz, a Energia Maior, o receba, o acolha, o acalente e lhe ensine. Tudo ficou muito incompreendido: o porquê  desistir de viver, o porquê de não pedir ou gritar por ajuda, o porquê deixar todos em sofrimento, o porquê, o mas porque. Bem, perguntas que jamais serão respondidas!

Mas voltando a minha semana, a minha motivação... Sim, teve uma motivação: foi sentir-me oco e vazio, foi ser alvo da desvalorização do EU, como Homem, foi sentir-me solto numa selva, com medo, inseguro, foi a soma do sofrimento prévio de uma separação (intensa e recente), a soma do medo, da perda, do abandono, da insolvabilidade, da instabilidade psíquica, de uma momentânea experiência humana vazia, oca, mas para mim impactante, pois as relações humanas pareciam banalizadas.

               Estes motivos "aparentemente" fúteis e banais (perante o VIVER) foram a minha motivação para concluir que a VIDA havia perdido a razão. Hummm razão, eu buscando razão num contexto de extrema emoção/frustração. Louco isso! (Apenas uma auto reflexão em voz alta).

Pois é, eu, mais uma vez, enganadíssimo.

Quem seria eu a julgar as construções e relações de terceiros. Porque questionar aquele modelo? Apenas por não me enquadrar nele? Julgar sem conhecer o contexto daquela construção, sem saber quais os alicerces e o quão fortes eram? Julgar por não querer, simplesmente, dividir daquela experiência, daquele momento? Julgar por querer eu o meu modelo? Erro fatal!

Não importa se certo ou errados, estavam felizes naquela construção e pronto. E nada mais justo que cada um busque a sua felicidade, a sua verdade!

Sim, a semana passou...

Agora, já com todo o suporte necessário, família, amigos, médicos, psicoterapeuta, enfim todo o APOIO, tudo se torna mais fácil! Sim, estou melhor, confiante, livre de julgamentos, e com uma única certeza, a de VIVER E NÃO TER A VERGONHA DE SER FELIZ!

DOUGLAS GODOI, MÉDICO E MAIS FELIZ...



PS:
"Prevenção do suicídio:
0-800-273-8255
0800 290 0024"
Não funcionou tá... Não atendem celulares, há necessidade de se expandir a rede! SAMU? Não sei, não buscaria esse recurso tamanho a demanda que têm! Há de se criar e divulgar algo beeem direcionado!

Douglas Godói

Ao som de ' "Opus" from Opus - Eric Prydz'
Degustando Tâmaras Centenárias das Margens do Nilo

quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

Direções

Cento e oitenta graus de horizonte
Escurecido, iluminado, escurecido,
Timidamente iluminado.

No norte, a um palmo da superfície
Há uma nuvem rala, relâmpagos,
E uma tímida lua quase cheia
Beijando águas calmas.

A leste, um violão ressoa
Um pop dos últimos 10 anos,
E suponho que um brasileiro
Canta um inglês quase bem
Alternando com Norah Jones
Numa vitrola moderna.

No sul, mistérios guardados
Em cada quarto acesso,
E em cada traseunte
Que busca descanso
- do corpo, da alma, da vida.

A oeste, tudo que desejo:
Um coração petrificado (certamente!)
Que anseia por carinho (emoliente)
Um choro engasgado (descrente)
Que lacrimeja e respinga (quente)
Em cada lembrança (da gente).
Há também amor retido,
- talvez ferido (depois) -
Em cada ausência minha (de nós dois).
Há, sobretudo, um futuro latente,
Bonito, ansioso,
E presente.

Ismael Alexandrino

Ao som de 'Better Man' - Robbie Willians
Degustando Água com Gás