Crônica
Morei alguns anos longe da minha família. Maior parte deste tempo morei a dois mil e quinhentos quilômetros longe de todo mundo que amo. E, em certa época, cheguei a morar quase dez mil quilômetros. Como me doía o fato de querer um abraço sem ter que pedir e, simplesmente, não tê-lo.
Ultimamente tenho pensado no significado do abraço. Quando nascemos, tão logo nosso cordão umbilical é cortado, umas das primeiras coisas que nos acontece é sermos abraçados pelas nossas mães. Estou convicto de algo: abraço de mãe no recém-nascido vicia. É, vicia. Depois dele, passamos a vida toda querendo ser abraçado.
Fico imaginando aquelas pessoas muito carrancudas, de semblante fechado, hostil, que querem ser raivosas, se elas não se sentem bem quando são abraçadas. Principalmente aqueles homens que adoram posar de machões, que dizem que não gostam dessas coisas, que isso não é coisa de homem. Engraçado: sou homem físico e psicologicamente muito bem resolvido, e adoro um abraço. Pode ser rápido, apertado, de leve, carinhoso. De preferência aconchegante e demorado.
E, tudo isso, não precisa ser necessariamente da namorada. É claro que o abraço da amada tem um significado especial. Estranho se não fosse assim. Mas o fato é que gosto do calor humano, do contato com a pele, de sentir o outro coração. O abraço humaniza e, em mim, acalma por demais. Abraço de político e de bêbado confesso que não me agrada, mas aí já são situações específicas de desagrado.
Quem não gosta de quando está aflito, com vontade de chorar ou com medo, de um abraço aconchegante? Quem não se sente impulsionado a abraçar e pular com pessoas queridas quando recebe o resultado de uma aprovação no vestibular, num concurso, ou quando ganha algo que almejava bastante? A conquista a ser festejada é a medalha, mas o abraço é o Champagne para brindar a comemoração, o divertimento. Quando o Champagne é estourado nos pódios da vida, nada mais é que uma demonstração de alegria estourando também, e não há quem não queira ser abraçado e festejado naquele momento.
Minhas irmãs costumam dizer que eu sou “beijoqueiro”. Admito. Gosto de beijar. Gosto de ser beijado. Seja na boca, seja no rosto, seja um beijo jogado ao vento. Mas sou “abraçeiro” também. Hoje, no meu consultório, de onde escrevo esta crônica, atendi uma paciente especial. Ela tem um problema cognitivo; sempre que a vejo meu coração saltita de alegria. Amuriel adora abraçar. A mãe dela tenta contê-la, fica constrangida, mas não há uma consulta que Amuriel, na sua inocência e falta de maldade, não me dê um beijo no rosto e um abraço apertado. E o abraço dela é daqueles que pega pela cintura até o outro lado do corpo, e bem apertado.
Como foi gostoso receber aquele abraço com a sinceridade de uma criança, sem maldade, sem malícia, e cheio de amor.
Ela usa alguns remédios controlados sem os quais ela teria crises convulsivas. Então, mensalmente, ela precisa me ver para que eu possa reavaliá-la, e renovar sua receita. Mas o que ela não sabe é que a presença alegre dela no meu consultório, com seus dentes a maioria precisando de cuidados odontológicos, com seu jeito espalhafatoso, mexendo em tudo, perguntando tudo, e babando em meu rosto, é que ela com toda certeza faz muito mais bem a mim do que eu faço a ela.
Espero que você, querido leitor, não perca tempo de vida sem abraçar quem você ama, sem sorrir para quem você vê todos os dias e que, às vezes, só precisa disso: de um sorriso, e de um abraço. Posso te garantir que só te fará bem à saúde do corpo e da alma. Seu e do outro.
Torço para que nos encontremos sempre. Até lá, receba meu sincero e afetuoso abraço.
Ismael Alexandrino
Ao som de 'Como eu quero' - Leoni
Degustando Frapê de pêssego
Imagem: 'O abraço' - Bia Moraes