Café Alexandrino - O lado aromático da vida

quarta-feira, 28 de junho de 2006

Esporte e Violência: uma combinação nada perfeita

Redação Dissertativa


A mídia já veiculou várias matérias referentes à violência dentro dos estádios de futebol, esclarecendo que, se nesses locais houvesse maior segurança e reinasse a paz, os clubes poderiam lucrar quase 50% a mais do valor atual, sem falar que muitas famílias que só não freqüentam tais ambientes por medo dos inúmeros atos violentos que assumiram a cotidianidade do normal poderiam ali encontrar um entretenimento.

E ontem, em plena Copa do Mundo, quando se espera o mínimo de respeito, quer por quem joga, quer pelos torcedores e telespectadores, Portugal e Holanda deram um "show"... De pancadaria.

Pensando nesse tema de suma importância, resolvemos elaborar uma redação dissertativa acerca da intrigante questão:
o esporte, e enfaticamente o futebol, contribui para desenvolver a amizade ou a rivalidade entre os povos?


O esporte, desde os tempos clássicos, sempre teve como escopo o congraçamento entre os povos. Nutrir uma mente sã num corpo sadio era notável ideário que contribuía para o melhoramento das raças (ou de uma única raça, a humana, como preferem alguns) e união de todos. Contudo, hodiernamente, se assiste a competições esportivas que têm propiciado um triste clima de violência, quer por desavenças partidárias, quer por intrigas políticas, quer por picuinhas pessoais.

Nesse sentido, vive-se a época da banalização da violência. No decorrer de eventos internacionais, por exemplo, é comum o confronto hostil dos atletas que guardam sentimento de rivalidade pelos mais variegados motivos. Parece estar em jogo a superioridade econômica ou histórica dessas nações.

Mas não apenas em nível mundial se torna evidente essa disputa inferior e antiesportiva. O mesmo espírito de guerra é encontrado entre os pequenos e grandes clubes nacionais. Ninguém desconhece o fenômeno das torcidas organizadas, verdadeiramente beligerantes dentro e fora dos campos de competição.

Ultimamente, esse espírito agressivo filiou-se ao esporte de modo regional e universal. Não raro, aqui e acolá eclode uma contenda entre jogadores ou torcedores ou, ainda, entre ambos. A brutalidade, a estupidez e a incivilidade ganham proporções absurdas, de tal sorte que os mais exaltados, muitas vezes, são presos ou mesmo mortos a pauladas e a tiros.

A contrario sensu, é relevante que se registre o fato de que o exercício do esporte também propicia momentos "harmoniosos" e de relativa paz. Recentemente, em 2003, palestinos e israelenses compartilharam juntos (pasmem!) do jogo "Brasil versus Inglaterra" em considerável tranqüilidade; entretanto, é bem verdade que, após este, cessou-se a calmaria, a concórdia.

É deveras lamentável, pois, que um ideal inicialmente tão nobre inverta-se em páginas de violência e crônicas policiais. Quando não domina a emoção, o homem é capaz de regredir ao nível dos irracionais. E, nesse calor, queima-se toda razão e fenecem os ideais mais salutares.

Yuri Monteiro Brandão


[1] Este texto foi publicado no Blog Cultural Textos & Contextos, pertencente ao autor.
[2] Yuri Monteiro Brandão, aos 22 anos, está acadêmico do 4º ano de Direito da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), estudante de Filosofia e Línguas (latim, grego e italiano) do Seminário da Arquidiocese de Maceió, ex-secretário de finanças do Diretório Central dos Estudantes Zumbi dos Palmares, ex-monitor de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira do Impacto Curso, tradicional curso pré-vestibular da capital alagoana, ex-trainee jurídico por Motta e Soares Advocacia & Consultoria, ex-colunista do jornal Primeira Edição e colunista do "O Jornal". É também parceiro do "Amigos do Livro", do Grupo Editorial Scortecci, e colaborador do site Releituras, seção "Novos Escritores".


Ao som de 'É uma partida de futebol' - Skank
Degustando Chá Mate com Rosquinha Frita
Imagem:

terça-feira, 13 de junho de 2006

Com licença, vou amar...

Crônica









Em tempos hodiernos, muito se fala sobre o amor. Pouco amor se vive. É tema bonito, politicamente correto, alimenta o comércio, é letra de música em diversos ritmos, mas poucos -- poucos! -- têm o privilégio de vivê-lo de forma integral.

Viver o amor não é fácil. Exige renúncia, condicionamento, disciplina, esmero, doação. Viver o amor demanda, inclusive, tempo. Ah!, mas tempo é dinheiro, diriam alguns. Tudo bem, mas não há dinheiro no mundo que consiga comprá-lo. Amor não é dinheiro, seu valor é outro, muito acima de coisas compráveis, mesmo as que, supostamente, são bens duráveis.

Já ouvi dizer que sou sonhador demais, que vivo fora da realidade, que chego a ser besta, careta, pois amor não existe. Amor entre um homem e uma mulher, segundo os que ousam teorizá-lo nos bares da vida, não passa de tesão, ou melhor, ereção. O amor, neste caso, terminaria com ejaculação. Fico pensando quão seria efêmero se fosse assim. Já pensou nos que têm ejaculação precoce? E os brochas impotentes? Coitados! Estes, com certeza, nunca amariam ou seriam amados. Fidelidade coexistir com amor então, aí já é pedir demais. Para muitos -- quase todos --, é a utopia máxima que, porventura, possa existir.

Seria eu o utópico em pessoa? Não! Não mesmo! Sou um privilegiado, admito. Sou um dos únicos, sou um dos últimos. E o meu amor, no sentido de alma gêmea, ter uma pessoa amada, não é genérico. Meu amor tem nome, registro de nascimento e endereço fixo. Responde pelo nome de origem francesa "ILA", e guarda em seu significado "ilha". Não porque seja cercada de água por todos os lados, mas talvez porque ela seja cercada pelo meu amor por todos os lados e de todas as formas possíveis: eros, frater, philos, ágape.

O amor existe sim e não me interessa quem o desacredite e me veja como um sonhador ufano. Sou sonhador mesmo, pois tenho inúmeros motivos para sonhar, para viver, para regozijar naquilo que me foi concedido de graça. Não me importo em tentar definir o amor, muito menos criar uma cartilha de ditames. Ele não é teórico, é puramente prático e só se aprende amando. Importa-me, tão somente, senti-lo e vivê-lo, pois ele existe.

Com licença, vou amar...

Ismael Alexandrino


Ao som de 'Você é linda' - Caetano Veloso
Degustando Romeo e Julieta
Imagem: Presentes que ganhei no dia dos namorados

terça-feira, 6 de junho de 2006

O Pescador de Sonhos

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Conto


Todos diziam agora que Roberto era um homem diferente. Mas não era por nada que se apercebesse pela estética ou por qualquer coisa do tipo, mas sim por seu comportamento. Freqüentemente Roberto saía bem cedinho em seu barco dizendo que ia pescar. Passava o dia todinho em alto-mar e só voltava ao final da tarde. O que era estranho é que Roberto não voltava mais da pescaria com um peixe sequer. Como Roberto antes era tido como um dos melhores pescadores da vila, chamavam-no até de "o farejador de peixe", todos começaram a estranhar essa súbita "maré baixa" de Roberto.

Paralelamente à maré baixa de Roberto, ele começou a se apresentar estranhamente mais alegre. Antes sempre duro, bruto até, poderia-se dizer que agora Roberto sorria abertamente para todos os lados. Era freqüente ao retornar da pescaria, sentar-se um pouquinho e contar algumas "histórias de pescador" para as criancinhas que sempre circulavam pela marina ao fim da tarde. Elas o ouviam atentamente e tinham um carinho todo especial agora por aquele 'pescador diferente', como elas o chamavam. Até mesmo em casa, Dona Maria, sua esposa, o achou estranhamente mais comunicativo, dando mais atenção à família e aos filhos, de quem antes sempre mantivera certa distância.

Ninguém sabia o que tinha acontecido a Roberto para ele agora se portar daquele jeito. O tempo foi passando e alguns comentários foram surgindo. Seu Zé da mercearia achava que aquela 'maré baixa' de Roberto era coisa da idade que ia chegando e a habilidade que em conseqüência estava indo embora. Pedro de Cida, freqüentador assíduo da Bodega do Joaquim, dizia que ele estava ficando era louco, por isso não sabia mais pescar. Seu Joaquim, por sua vez, dizia que aquilo era sim coisa do demônio, que ele devia era ter mexido com o que não presta para estar com esse azar. Dona Maria, entretanto, não pensava em nada disso, em nenhum momento tentou entender o que tinha acontecido com seu marido, só começava a se angustiar com o dinheiro que estava indo embora e nada de o marido voltar ao normal. Mas, certo dia, após repensar todas essas idéias que ouvia sobre seu marido na rua, ela não agüentou e disse:

- Ô homem, o que é que tu tem que tu num volta mais com peixe das tuas pescarias? Tu arrumasse outra família e tas levando o peixe pra eles é? Num tá vendo que o dinheiro já não esta dando nem pra comprar comida?

E Roberto respondeu calmamente:

- Maria, eu sei que a situação tá engrossando, mas tenho fé que tudo vai passar e melhorar.

- Melhorar como se tu num pesca mais nada? Ou se o que tu pesca tu tá levando pros outros?

- Maria, não sei se você percebeu o quanto eu mudei de uns tempos pra cá. Em nenhum momento você chegou pra conversar comigo ou me questionar. Preferiu juntar tudo e explodir de vez com essa mágoa, me julgando e me acusando como você está fazendo agora. Foi por isso que não notou que todos os dias eu saia com meu barco não com redes de pesca, mas sim carregado de tabuas. Essas tábuas, Maria, era para construir o meu sonho, um sonho de uma vida melhor para a gente, era para construir um grande cercado de peixes onde pudéssemos ter sempre uma grande criação e tirar nosso sustento sem depender da maré que está cada dia pior. Então, Maria, eu não estava louco, nem possuído por má sorte do demônio nem muito menos sustentando outra família como vocês pensaram. Eu estava apenas acreditando nos meus sonhos. Mas em nenhum momento você parou para perceber isso, preferiu interpretar as coisas do seu jeito, somar com as interpretações maldosas dos outros e aproveitar algum momento de mágoa ou rancor pra jogar tudo isso na minha cara, mais preocupada em me agredir do que em me ajudar ou me entender. Mas não a culpo por isso Maria, infelizmente estou acostumado com essas coisas, é assim que acontece com a maioria das pessoas. Quer saber Maria, pode até ser que o cercado que eu esteja fazendo não dê certo, mas eu só lhe peco uma coisa Maria: nunca queira me tirar o direito de sonhar.

Roberto foi dizendo isso enquanto levantava seus olhos e os voltava em direção ao mar, em um misto de reverência e fascinação.

Ricardo Gurgel


Ao som de 'Amanheceu, peguei a viola' - Almir Sáter
Degustando Chá de Menta com Chocolate
Imagem: 'El Pescador' - Alfred Rogoway

sexta-feira, 2 de junho de 2006

Enquanto isso, meu primeiro amor

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Ensaio


Estou deitado de lado com a mão na cabeça contemplando teus olhos verde-azulados. Nada me parece tão singelo quanto a profundidade do teu olhar. Já faz horas e horas que estou assim a admira-la. Se Auguste Rodin me visse desta forma, talvez pintasse um novo quadro. Quem sabe intitulado de "O Admirador". Se da Vinci visse tua silhueta e teu sorriso, talvez ousaria pintar o irretratável. Pode ser que nomeasse a tela de "A Nona brisa".

De fato pareces uma brisa do mar. Não necessariamente vista, mas sempre sentida. Consegues envolver as figuras na praia sem mesmo que estas, muitas vezes, notem. O fato é que consegues emoldurar o cenário. As ondas seguem o teu ritmo, os cabelos se esvoaçam, a areia fica na iminência de levantar e partir. É incrível como és capaz de esculpir o teu entorno. Onde tocas, modificas. E uma vez modificado, nunca mais torna a sê-lo como era antes.

Quando me tocaste a primeira vez, lembro bem, fora-me algo bastante peculiar. Algo parecido como o primeiro amor: idealizado e cantado por muitos, mas que poucos conseguem tocá-lo, senti-lo, vivê-lo. Naquela posição que eu estava, estático, pensativo, reflexivo, admirado, nada mais era do que um ser enternecido diante do seu amor, do primeiro amor.

Ah se eu fosse um poeta! Certamente, fazer-te-ia a mais bela poesia. Como não sou, faço-te o meu próprio poema. Admiro a beleza estética, a métrica e a rima, mas toco a alma extraindo dela a essência. Quem dera, eu fosse um romancista! Transcreveria nossos passos nas páginas de um livro tão bem como Shakespeare escrevera Romeu e Julieta. Mas, isso também não é especialidade. Então faço da nossa vida um best-seller recheado de capítulos de amor tão bonitos e singulares que nem o melhor dentre os escritores conseguiria descrevê-los. Se eu fosse um cantor, talvez eu comporia uma música especial. Como não nasci com este dom, faço-te a minha letra principal. Tocando seu corpo que mais parece um refinado violão, componho a mais bela melodia já vista. Canto-te como minha mais bela canção. Se eu fosse um maestro, sem dúvidas regeria sua vida. Contudo, prefiro reger os teus passos em minha direção. Sempre. E quando chegas até mim, peço que o faça repetidas vezes -- uma partitura recheadas de ritornelos. Se fosse um ator, meu maior desejo seria contracenar contigo. Como também não o sou, opto por fazer contigo o meu par romântico no palco da vida.

Nasci assim...à primeira vista, meio que sem dons especiais. Simples como o amor. Contudo, ao teu lado, nunca deixarei de procurar o tom. Mas farei deste tom algo incomparável, almejado, único, singular, intangível, sus generis. Regra de fé e prática. Amar-te-ei com a singeleza e a devoção de primeiro amor que és e que para toda vida há de sê-lo. A tua felicidade será o meu objetivo. A minha vida será o veículo. A nossa vida será o caminho. E que este possa sê-lo sempre completo, porém simples, assim como o amor. Pois ao teu lado, sentindo o teu amor, consigo ter a certeza que é na simplicidade que a vida floresce.

Ismael Alexandrino


Ao som de 'Contra o tempo' -Vander Lee
Degustando Chocolate Quente com Granulados Coloridos
Imagem: 'Woman Reading' - Pablo Picasso