Café Alexandrino - O lado aromático da vida

quarta-feira, 29 de março de 2006

Soneto da União

Poesia

De repente do pranto fez-se o riso
Eufórico e colorido como o arco-íris
E dos azuis arregalados da sua íris
E dos abraços apertados o amor preciso.

De repente do vendaval fez-se a calmaria
Que dos olhos brotou de quem ama
E do amor fez-se o sentimento que ficaria
E deste a eterna união que se proclama.

De repente, não mais que de repente
Fez-se alegre o amado-amante
E unido aos demais viajantes.

Fez-se do amigo mais distante o irmão
Fez-se da vida uma aventura contagiante
De repente, alegrou-se o coração.

Ismael Alexandrino


Ao som de 'A paz' - João Bosco
Degustando Sorvente de Creme com Licor de Chocolate
Imagem: 'Vila da Paz' - Lucinda Lírica

sábado, 25 de março de 2006

Escravos da liberdade

Crônica

Que conceito de liberdade permeia nosso entendimento, à luz de Aurélio e à Guisa de nós mesmos, em face da conjuntura que a história nos prescrevera? É possível que uma reflexão mais acurada do pretérito que escrevemos, após os eventos do Ipiranga, da Lei Áurea e da expulsão dos holandeses e judeus de Pernambuco, nossa visão sobre este tema mude um pouco! Liberdade, talvez, seja uma das coisas mais relativas da vida.

Que Estado livre nos outorgou Dom Pedro, diante de todos os descaminhos governamentais por que passamos, das Capitanias Hereditárias à ditadura militar e, mais recentemente, à democracia vilipendiada pelos estrondosos escândalos de corrupção, que ferem o erário brasileiro e os preceitos básicos de ética e civismo da nação?

Que liberdade nos outorgara a Princesa Isabel, se nossos semáforos, hoje, são moradia e ponto de mendicância de verdadeiros escravos sociais ? na maioria dos casos ? de pele pigmentada?

Que liberdade nós conquistamos ao expulsar daqui Maurício de Nassau e, com ele, alguns princípios de cidadania que o tempo é pródigo em mostrar que não fomos capazes de desenvolver, enquanto "livres"?

Que idéia de liberdade formamos ao açoitar o capital judeu, no início de nossa organização sócio-política, se somos escravos, agora, do dinheiro volátil internacional, que deixa nossa economia a mercê dos eventos globalizados, os mais diversos? Parece razoável pensar que nos constituímos escravos de nosso passado, de nossas dívidas externas e de nossos próprios mecanismos de sujeição. ? O que dizer do INSS e da CPMF sem saúde, do IPVA sem estradas, do IR sem escolas e das dezenas de siglas dentro deste mesmo diapasão?

Como se não bastasse, a modernidade e a violência, travestidas de liberdade, nos apregoam uma escravidão sem antecedentes em nosso país! Esta convulsão social que construímos nos castrou a liberdade de caminhar pelas ruas das cidades, nos tirara o direito de entrar num estabelecimento comercial sem o pavor dos assaltos, de dirigir nossos veículos sem o pânico do seqüestro e do roubo iracundo! Pior, ainda, essa escalada de violência está formando, no bojo social mais limpo, uma nova mentalidade conceitual. Não raro, ouvimos a seguinte colocação de vítimas coagidas pelo crime xucro e desumano: "Graças a Deus que só levaram o carro e os pertences materiais!" ? Onde vamos parar? Ou melhor, aonde não vamos, porque a melhor política, hoje, é não sair de casa (estamos presos em nossas próprias residências)!

Finalmente, a tecnologia e suas grandes conquistas ? pautadas na busca da independência humana ? nos escraviza ao agredir a liberdade individual, em gradação constante! Somos escravos modernos de longas horas-extras de trabalho, às vezes, madrugadas-a-dentro, para atendermos à demanda de e-mails e afazeres outros desta nova época! E o que dizer do telefone móvel, que nos cerceia o direito mais genuíno de, em algum momento mais nosso, não termos o direito de não estar!

Assim, parece cada dia mais viva a célebre frase do brigadeiro Eduardo Gomes, que em 1946 perdera a disputa pela Presidência da República para outro militar, o General Eurico Gaspar Dutra: "O preço da liberdade é a eterna vigilância".

Sinceramente, precisamos rever nossos conceitos de liberdade, ou de escravidão.

Avaniel Marinho

Ao som de 'História da Liberdade no Brasil' - Martinho da Vila
Degustando Café Preto
Imagem: 'A Liberdade Guiando o Povo' - Delacroix

terça-feira, 21 de março de 2006

Medicina e cura

Ensaio

Ao se falar de métodos de cura tem que se ter a noção que nem sempre fala-se de medicina. Portanto, não cabe na discussão a vituperação de quaisquer ciências ou atitude que possam de algum modo promover a cura de alguém.

É sabido que a medicina atual, principalmente a ocidental, encontra-se altamente arraigada e com os pés calcados num tecnicismo positivista voltado à erradicação de doenças. Contudo, uma visão menos segmentada do ser humano deve ser analisada pelo médico que se propõe a cuidar de um doente. Digo "cuidar" do doente por achar tal verbo com uma semiótica mais completa do que o "curar". Curar se detêm apenas no fato de recuperar a saúde. Cuidar vai além! Cuidar é zelar pelo bem-estar ou pela saúde de alguém, mesmo que a cura não seja possível.

Concerne ao médico, o entendimento e compreensão de que muitas doenças apresentam um viés psicológico importante e, como tal, a terapêutica nem sempre está atrelada somente à administração de drogas, principalmente as alopáticas. O que se percebe é uma discriminação e preconceito com relação aos diversos métodos de cura. Tais atitudes devem ser revistas, pois sabe-se que, desde os tempos longínqüos, praticamente todas as civilizações utilizam algo que foge ao científico, ao empírico, para se obter a cura. Magias, mitos e elementos religiosos, tudo se unia de alguma forma à ciência, adaptando-se à cultura local para se curar um enfermo. Daí vieram muitas técnicas e costumes que hoje são empregados como, por exemplo, cromoterapia, yoga, heik, curas mediúnicas, acupuntura, fitoterapia, dentre outras.

Assim, de uma forma holística, depreende-se que, muitas vezes, controlando a psiquê do indivíduo, harmonizando-o espiritualmente e até mesmo socialmente, obtém-se a cura alcançando, desta forma, o pleno cuidado do paciente. É importante que o paciente tome consciência do processo do seu tratamento aderindo-se a ele, tornando-se um agente. Daí mais um fator relevante dos métodos alternativos; pois, sendo eles menos agressivos ao organismo, torna-se mais fácil a adesão.

Em suma, percebe-se que a nobre arte de curar extrapola os ensinamentos da academia médica e, por conseguinte, os limites do empirismo científico. Posto feito, ao cuidar de um paciente, a individualidade de cada um deve ser analisada, bem como respeitada as diversas terapias, tratando o próximo sempre com muita dignidade e humanismo.

Ismael Alexandrino

Ao som de 'I remember' - John Pizzarelli
Degustando Café com Raspas de Chocolate
Imagem: 'Retrato do Dr. Gachet' - Vicente van Gogh

domingo, 19 de março de 2006

O sexo já foi um comício e hoje é um mercado

Crônica

Eu só penso em sexo. Você também, recatado leitor. Todos os nossos sentimentos estão sendo canalizados para um mesmo buraco. Nunca vi a mídia tão sexualizada como hoje em dia. Ando pela rua e todos os outdoors são de mulher nua ? outro dia, quase bati o carro na Marginal Pinheiros, por causa da lourinha nua da "Playboy". Todas as capas de revista, tudo, é uma grande feira de mulher gostosa e homens raspadinhos. Tudo parece liberdade, mas a coisa é outra.

O programa do SBT, por exemplo, "Casa dos artistas", joga com uma aparente liberdade, mas trabalha com um voyeurismo baixo nível, com o público apenas querendo ver "quem come quem". O desejo do público é ver pelo "buraco da fechadura" a pretensa "descontração" dos "artistas", pois para a população de pobres trabalhadores, artista ainda é sinônimo de prostituta ou malandro, como para Silvio Santos, como no século XIX. Por que não mostram a casa das elites? Ou a casa do próprio Silvio? Não. Ali, não. Ali moram as famílias, a base social da revista "Caras", longe dos "sem-vergonhas" de sunga. Nunca vi tanta propaganda na mídia do sexo de consumo, a azaração e o sexo quantitativo te levando a comprar um sabonete ou a beber uma cerveja. A propaganda nos promete uma suruba transcendental. Todos queremos ir. Mas onde é?

Diante desta orgia pública dos milhares de corpos malhados de moças pobres e esperançosas, nos sentimos mal comidos, insatisfeitos, certos de que há uma casa de artistas de TV e playboys que se dão melhor que nós. Todos somos otários diante deste harém movente de apresentadoras, modelos, malandros e heróis sem camisa.

Antigamente, ou seja, nos anos 60 (oh... os recentes anos remotos) o sexo era uma novidade política, depois dos caretíssimos anos 50, quando até a gravidez era uma espécie de doença venérea, como disse o Rubem Braga. O sexo tinha algo de crime, algo de secreto, o pecado perfumava nossas vidas com o estímulo da culpa. Não havia motéis, nem pílula que, depois, fizeram mais pela liberdade sexual que mil livros feministas.

Nos anos 60, sexo era revolução política. Tudo era político. Eu me lembro da carta de amor de um comuna amigo meu que dizia para a mulher amada: "Querida, nosso amor é também uma forma de luta contra o imperialismo norte-americano". O sexo dos anos 60, o sexo teórico, o sexo utópico, mitológico (para pequeno burguês intelectualizado, claro...) era o apagamento de diferenças, uma normalização do prazer que abria as comportas da liberdade para outras conquistas sociais. O orgasmo para Reich e seus seguidores era uma espécie de vitória contra a burguesia. O sexo dos 60 era um comício; mas tinha o defeito de acabar com a culpa, com o limite, com o proibido. Todas as sacanagens foram testadas, mas chegou-se ao outro lado com uma vaga insatisfação. O que faltava? Faltava o pecado. Sem o pecado ficamos insuportavelmente livres.

Com a re-caretização do mundo nos anos 70 (o mundo gira com movimentos de vai-e-vem, como uma cópula) a liberdade aparente conquistada andou para trás. A desrepressão deu lugar à "des-sublimação repressiva", como nomeou Marcuse, uma "liberdade" tão ostensiva e grossa que é um louvor à proibição. Depois de Jimi Hendrix, tivemos os BG?s, depois de Woodstock, tivemos "Saturday night fever", depois de Janis Joplin, tivemos Olivia Newton-John. Os sonhos viraram produto. Criou-se um mercado da liberdade. Todas as conquistas dos anos 60 viraram fetiches de consumo: revolta, igualdade, utopias, até o desespero e a angústia passaram a vender roupas e costumes.

A partir dessa época até hoje, sob a aparência de grandes euforias narcisistas, de gestos e risos de prazer, há uma volta à caretice; no mundo de bundas e coxas lipoaspiradas, seios siliconados, bofes comedores, existe um regressismo oculto. O sexo, que prometia ser a democratização do corpo para todos (ohh utopias...) voltou a ter uma clara configuração "de classe". A anatomia virou uma das poucas portas de fuga da classe baixa. Com a democratização e a sociedade de massas, o sonho pequeno burguês de um orgasmo utópico foi apropriado pelos excluídos como uma saída para a miséria. Nuas, todas as mulheres são iguais; a democracia da bunda. Lembram-se da menina mendiga que tentaram transformar em modelo ou da moça do MST que foi para a "Playboy"? A bunda é a esperança de milhões de Cinderelas. A mídia e a propaganda compraram a liberdade, que não é mais "uma calça velha desbotada", mas é a superação do pudor, da intimidade. Se alguma mulher ficar famosa, tem de tirar a roupa. O strip-tease é a anti-burka, mas, no fundo, meio igual. A pessoa não tem mais um corpo; o corpo é que tem uma pessoa, frágil, tênue, morando dentro dele. De dentro dos maiores "aviões" de bumbum exposto, de seios balouçantes, de coxas frementes e atemorizantes, sai uma vozinha romântica, desejando amor e filhos, pureza e lar. O corpo e a pessoa são duas coisas diferentes; a menina mostra sua bunda como se fosse uma irmã siamesa. Tanta oferta sexual me angustia, me dá a certeza de que meu desejo é programado por outros, por indústrias masturbatórias, me provocando tesão para me vender satisfação.

Ninguém mais quer ser "sujeito": todos querem ser produtos. Ninguém quer ser livre, todos querem ser mais usáveis, consumíveis. O corpo tem de dar lucro. Todo mundo quer ser coisa. Ser "coisa" é melhor, não sofre de dúvidas, conflitos, humilhações. Queremos ser BMW's, aviões, lanchas de luxo, queremos ser desejados como um jet-ski ou um vestido da Daslu.

Arnaldo Jabor


Ao som de 'Amor e Sexo' - Rita Lee
Degustando Cereja com Creme de leite
Imagem: 'Amante' - Jorge Campanã Barranco




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terça-feira, 14 de março de 2006

O Ser Poeta

Poesia

Homenageio neste Dia do Poeta o amigo e poeta Avaniel Marinho

Ser poeta não é ser algo demais;
Ter algo demais não é escrever poesia.
Ser poeta não é saber escrever;
Ter escrito não configura maestria.

Ser poeta não é, simplesmente,
Ter decorado muitos versos na mente.
Ser poeta não é saber escrever poemas rimados,
Não basta escrever sonetos metrificados,
Pois ser poeta não é somente ser letrado.
Conheço muitos que escrevem,
Mas que nunca amou
E nunca foi amado.

Letras vêm e vão,
Mas poesia de verdade
Nasce primeiro no coração.
E, para isso, é preciso ser amado,
Estar sempre apaixonado,
Mesmo que não saiba o nome da paixão.

Ser poeta é ter nas mãos muitos sonhos,
É manufaturar realidade.

Para ser poeta é preciso, fundamentalmente,
Fazer da própria vida
A mais bela poesia,
Pois ser poeta não é cargo, nem função.

Ser poeta é estado(permanente) de espírito,
É estilo de vida,
-- Vida bela! --
Vista com os olhos sempre cristalinos,
Marejados de muita emoção.

Ser poeta é amar intensamente,
Ser poeta é ser simples...
Ser poeta é ser gente.

Ismael Alexandrino

Ao som de 'Se Todos Fossem Iguais A Você' - Tom Jobim
Degustando Capuccino de Chocolate com Avelã
Imagem: ' il Poeta' - Pablo Picasso

segunda-feira, 13 de março de 2006

A chuva e a saudade

Poesia

A chuva que cai lá fora
E jorra pela rua sem demora
Traz para a terra a umidade
E para mim o frescor.

A saudade que sinto agora
Justifica-se nesta hora
Por estar noutra cidade
O meu verdadeiro amor.

Ele no sul e eu no norte!
Por isso, nesta chuva vou me jogar
E deixar a saudade a chuva levar...

Quem sabe eu tenha sorte!
Então, quando a chuva se for,
Pousarei nos braços do meu amor.

Ismael Alexandrino

Ao som de 'Those Sweet Words' - Norah Jones
Degustando Água de Côco
Imagem: 'Janela de Casa' - Ismael Alexandrino



sexta-feira, 10 de março de 2006

Se o Sol explodisse

Ensaio

Se o Sol Explodisse... Imagine, meu amor, se ele se arrebentasse todo... milhões, zilhões de luzes pequenas, riscos tortuosos. Seria lindo , querida, seria bárbaro.

Um espetáculo sem ingressos, só para nós dois. Olha só quanto fogo ! que brilho ! Repare nas águas do lagos e veja os raios subindo, olhe para o sideral, como desaba em tochas, em flechas incendiadas.

Incandecido está todo o horizonte, brasas voando por todos os lados desenhando milhões de rosas-dos-ventos. Toda a terra se abala, todo o universo se comove. Até a lua cede e derrama sua prata sobre nós, voce e eu.

Este momento de ouro e prata seria nosso e eterno. Um casamento excêntrico de céu em chamas e samambaias por tapetes, avencas e bromélias por paredes, pendidas dos ipês e paus do charco. A sinfonia norturna em profundo silêncio, entregue ao delírio do descomunal incêndio.

E tu, linda, toda formosa, emprestando do teu brilho àquela fogueira celeste, me impondo um sorriso grande, me fazendo brilhar tambem.

Quero acreditar que os carvões e cinzas nunca estarão nesta quimera, mesmo porque tu ainda nem chegaste para vivermos este espetáculo.

Sílvio Sebastião

Ao som de 'Se' - Djavan
Degustando Leite Condensado com Morango
Imagem: 'Fios de luz' - Cláudia Pudell Rossi

quarta-feira, 8 de março de 2006

Homenagem às mulheres

Discurso

Neste dia 08 de março, Dia Internacional da Mulher, parabenizo todas as mulheres, de todas as nações, culturas, raças e credos, reconhecendo a importância e o valor que cada uma -- indivualmente -- tem na nossa vida e na sociedade.

A sete delas, porém, importo-me em citá-las:

Divina Alexandrino, minha mãe,
todo meu reconhecimento pela mulher fantástica que é, exercendo a maternidade de forma ímpar e inigualável, que vai muito além de qualquer concepção terrena de amor...,obrigado por uma vida de amor a mim dedicada, pelo apoio incondicional, pela alegria e privilégio insondável e inegociável de ser o seu filho. Obrigado por me permitir a vida a partir do seu ventre aconchegante. Amo você, minha mamãe.

Ila Graebin, meu amor,
todo meu contentamento pela mulher companheira, cúmplice, carinhosa, amiga verdadeira e leal, amorosa...,obrigado por dar cor à minha vida e sonhar junto comigo sempre de forma encantada, fazendo-me querer viver ao seu lado para o resto da vida. Amo você, minha princesinha.

Gilsa Maria, minha irmã mais velha,
toda a minha admiração pelo exemplo de mulher forte, de garra, determinação e altruísmo quando se faz realmente necessário..., obrigado pelo amor e cuidado demosntrado à sua forma desde sempre. Você é um pedacinho de mim. Amo você, minha maninha.

Gisele Alexandrino, minha irmã mais nova,
toda minha admiração por ser tão somente o que é, pela sua meiguice, percebida em cada gesto e registrada em cada foto..., obrigado por ser assim, tão você, carinhosa, simples, meu xodó. Você também é um pedacinho de mim. Amo você, minha maninha.

Eunice Graebin, minha sogra,
todo o meu respeito e carinho pela mãe da mulher da minha vida que tem sido, pelo coração mole e generoso..., obrigado pela amizade, pelo zelo, pela compreensão mesmo nas divergências . Amo você, minha sogra.

Danyella Santana, minha cunhada,
todo meu carinho, gratidão e amizade durante todos estes anos de convivência, e que eles se multipliquem....obrigado por proporcionar-nos momentos tão felizes com sua presença marcante em nossa família. Você é como uma irmã. Amo você, cunhadinha.

Iza Graebin, minha cunhada,
todo meu carinho, gratidão e amizade nesse tempo compartilhado, e que eles se eternizem...obrigado pela sua alegria de viver, por ter o dom de nos descontrair sempre e por cuidar de quem eu amo. Você também é como uma irmã. Amo você, cunhadinha.

A todas vocês, dedico todo o meu carinho, amor, ternura, zelo, respeito, admiração, amizade e lealdade.
Que continuem sendo exemplo de mulheres que, reconhecidamente, são fundamentais na nossa existência.

Ismael Alexandrino

Ao som de 'Mulheres de Atenas' - Chico Buarque
Degustando Sonho de Valsa
Imagem: 'Miolo' - Amix

segunda-feira, 6 de março de 2006

Eu-rio

Crônica

Nem sempre tudo acontece como nos agrada. Aliás, com freqüência, rotineiramente, algo nos contraria. Há ações, há fatos, que, se pudéssemos, com certeza impediríamos sua realização. Há pessoas, que, se pudéssemos, também não deixaríamos ir, e outras tantas acolheríamos para sempre. Há sentimentos, que, por vezes, tenta nos rondar e se fôssemos capazes sempre, os mandaríamos para bem longe. Mas mesmo estes, às vezes, também nos acomete.

Encaro essa tentativa de injúria, essa fuga do nosso controle, essa contrariedade da nossa vontade como algo normal, passageiro, como um rio. Sim, um rio.

Assim como nós, o rio não se contém nas entranhas terrestres e então rebenta. A esse parto não chamam de "luz", mas nascente. Geralmente a nascente tem águas bem cristalinas. Ainda bem novinho, o rio já dá seus primeiros passos, faz suas primeiras e sinuosas curvas. Vai nutrindo-se aos poucos aqui e acolá. Come uma fruta, uma folha, engole uma raiz, um bichinho, bebe de outras águas, e assim vai se sustentando e crescendo. Talvez ele tenha uma vantagem em relação aos humanos: quando novo, não costuma engasgar. Aqui excluo as regiões muito secas, onde há rios intermitentes, que secam em certos períodos do ano.

Daí, bem alimentado, forte, ele segue seu caminho. Vira para a direita, sobe o nível – sim, o rio sobe o nível! Às vezes, corre para cima –, vira para esquerda, dá uma longa descida, depois mais uma bem rápida....Encontra alguns galhos e os leva consigo sabe Deus até aonde. Não raro, os rios encontram pedras pelo caminho, mas não as chutam e muito menos as xingam, ou lhes mostram gestos obscenos. Eles se compadecem, rodeiam as pedras ou as pulam e, quase sempre, até as lavam deixando-as belas. Às vezes o rio pára para descansar numa sombra. Ali ele enrola, enrola, pensa em voltar, mas segue em frente. Caudaloso e com postura elegante. O rio se renova. Tudo isso, segundo a sua vontade. Aí um detalhe: há vontade!

Contudo, algumas vezes vêm as chuvas e o faz derramar de tão cheio. Ele fica nervoso, enfurecido, perde o controle e não se preocupa com o que está à frente. Passa por cima de tudo, demolindo. Quando está assim, é melhor nem chegar perto. Outras vezes, chega um senhor de chapéu em cima de um trator e com petulância empurra terra em seu leito, joga terra em seus olhos, o empurra mais para lá, invade seu espaço. A todas essas coisas, porém, ele – o rio – não pode impedir. Mas o rio aprende a lidar com elas. Quanto às chuvas, tão logo elas passam, ele volta a se acalmar arrependido dos estragos que causou deseducadamente. Quanto à soberba humana em invadir o seu espaço, depredá-lo, ele – o rio – humildemente dá o seu jeitinho. Propõe um convívio mais superficial, ou procura outro caminho. Muitas vezes passa fome e até sede, mas sempre dá um jeito. Quão sábio são os rios!

Talvez se fôssemos mais rio e menos represa, melhoraríamos nossa caminhada e convívio social. As represas, os lagos, as lagoas – águas paradas que são – recebem tudo passivamente, águas boas e ruins, limpas e sujas. Recebem pedregulhos e os sedimentam, recebem sujeiras e, absorvendo-as, guardam-nas para si. Nada fazem para se renovarem. Contentam-se com uma pífia e lenta vaporização. Na verdade, geralmente é onde o rio morre, sua foz. Tornemos nosso dia-a-dia semelhante a um rio. E nessa congruência, atentemo-nos para a constante dinâmica em busca do equilíbrio.

Ismael Alexandrino


Ao som de 'Recomeçar' - Aline Barros
Degustando Chocolate ao Leite
Imagem: 'Cataratas' - Adri Furtado

sábado, 4 de março de 2006

Dona Cleuza

Conto

Estava exausto. A noite chuvosa reduziu o número de pacientes. Mas um plantão de emergência do coração, é sempre um plantão muito cheio de emoção. Gritos de desespero, de dor, de desamor. Sorrisos assustados, de alívio, de gratidão. Agito total, parada súbita. Silêncio constrangedor.

A madrugada chegou e tentei achar descanso num sofá puído. Fazia um frio artificial, fervilhavam algumas reflexões. O pensamento acelerava na medida em que a freqüência do apito no aparelho da sala ao lado diminuía. Em poucos minutos, mais um apito de vida calaria a voz. Talvez antes que o sol nascesse.

Como temia, antes do dia nascer, pude fitar os olhos opacos e sem reação de dona Cleuza.

Fui para casa tomar um banho. Debaixo do chuveiro eu não pensava em nada muito filosófico, apenas sentia aquelas gotas frias lavarem minha alma e refrigerarem meu corpo.
Limpo, percebi que meu estômago estava vazio a mais de doze horas. Desci com o intuito de comer algo no calçadão da praia. Nada muito pesado. Nada
que me saciasse por completo. A vida precisava sentir um gosto de querer mais.

Ao aproximar-me da faixa de pedestres, pude ouvir uma voz que ressoava
muitos anos vividos. Talvez, quase um século. "Você vai atravessar a rua?" Vou sim!, disse-lhe sorrindo. "Posso atravessar com você? Sinto-me insegura." Claro!, sorri novamente. Esperamos mais uns sessenta segundos até que o sinal esverdeasse nosso caminho.

Já na calçada, do outro lado da avenida, aquela senhora de feição suave agradeceu-me e me desejou bom dia. Bom dia! Qual o nome da senhora? "Cleuza. Mas pode me chamar de Dona Cleuza.", esboçando-me um sorriso. (...) Sim! Tenha um dia tranqüilo, Dona Cleuza!

E desejei realmente que a Dona Cleuza tivesse um dia bem mais tranqüilo que a noite de dona Cleuza naquele hospital.

Ismael Alexandrino

Ao som de 'Como nossos pais' - Elis Regina
Degustando Chá de Hortelã com Pão Integral
Imagem: 'Auto-retrato' - Marcus Davis

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quinta-feira, 2 de março de 2006

Sonhar não é proibido

Crônica

Caminhar é bom por dois motivos. Em primeiro lugar, trata-se de exercício físico, um antídoto contra o sedentarismo que nos ameaça a todos nesta era de telas - tela da tevê, tela do computador. Em segundo lugar, caminhar coloca-nos em contato com a realidade das ruas, das praças, dos lugares públicos. Uma realidade que, convenhamos, nem sempre é agradável, mas que não podemos nos dar ao luxo de ignorar.

Caminhando, cada um tem seus trajetos preferidos. O meu leva-me pela Protásio Alves e Osvaldo Aranha, o Bom Fim de minha infância, até o parque Farroupilha, onde sempre espero encontrar o casal Ostermann. Mas há um outro casal que me chama a atenção e que deve ser bem conhecido daqueles que andam pela Protásio Alves.

Eles são os típicos sem-teto, uma mulher e um homem já de certa idade, esfarrapados e maltratados pela vida. Carregam suas poucas coisas no clássico carrinho de supermercado que, aliás, é o único ponto comum entre a sociedade de consumo e a marginália. Ficam sentados, conversam, brigam entre si, pedem esmolas. Mas, no domingo passado, eu os vi entregues a uma atividade completamente diferente.

Os dois estavam diante da vitrine de uma loja de luminárias e conversavam sobre o que estava ali exposto, abajures, lustres. Eu preferia aquele ali, dizia o homem, apontando. Nada disso, retrucava a mulher com desprezo, é enfeitadinho demais, por mim eu ficava com aquele lá do fundo.

Nesse momento, eu me dei conta do que eles estavam fazendo. Estavam decorando, em imaginação, a casa que nunca tiveram e que provavelmente nunca terão. Mas a esta tarefa impossível eles se entregavam com dedicação, com prazer, com paixão mesmo.

Sonhar é uma coisa que está ao alcance de todos, mesmo de um casal de sem-tetos vagando pela avenida de uma grande cidade. Por um momento as pobres criaturas tinham saído da rua; por um momento, estavam morando em um apartamento confortável, cheio de lustres e abajures (e nem sequer se preocupavam com a conta da luz). Por um momento, estavam sentindo-se pessoas da classe média, aquelas mesmas pessoas que, num domingo de manhã, caminham pela Protásio Alves.

Sonhar faz bem. Aliás, é por isso que sentamos diante da tela de um cinema, ou diante da tevê vendo a novela. É por isso que ficamos diante da vitrine de uma loja, seja esta de eletrodomésticos, de roupas, de calçados ou de luminárias. Ah, sim: e é por isso, também, que existe ficção, uma espécie de abajur que ilumina alguns momentos de nossa vida.

Moacyr Scliar

Ao som de 'Pra não dizer que não falei das flores' - Geraldo Vandré
Degustando Café com Chocolate
Imagem:'óleo sobre tela' - Miguel Carlos Labra