Café Alexandrino - O lado aromático da vida

quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Uma questão de perspectiva

Crônica



"Do rio que tudo arrasta se diz que é violento / Mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem." Esses versos foram tirados do livro “Sobre a Violência”, de Bertolt Brecht, poeta e dramaturgo alemão que viveu no século passado. Medito sobre eles como quase nunca medito sobre poesia. Porque poesias não são escritas para serem meditadas, mas sentidas.

Mais que sentir, medito sobre esse trecho de Brecht. Ele fala sobre perspectivas, ângulos de visão. A minha visão, a sua visão; nossas diversidades. Quando nos deparamos com um problema gerado por outra pessoa, temos duas possibilidades: ou a julgamos de súbito, ou nos colocamos no lugar dela. Não raro optamos pelo julgamento precoce, pela impressão, pelo que parece ser. É quase inevitável tomarmos partido. Somos intolerantes por natureza. E a natureza humana tende a ser má, prima pelo instinto.

A perpetuação da espécie necessita de certo egoísmo. No meio animal é comum matar o outro se preciso for para garantir o seu espaço, proteger seu território, o seu modus operandi. Esta é a expressão máxima do egoísmo. Mas dos humanos se espera civilização, condição a qual o individuo se torna um pouco maleável em prol do próximo, da comunidade, de um “bem maior”.

Tem tudo a ver com o que chamam de “amar ao próximo”. E isso só é possível na medida em que você se coloca no lugar do outro. Afinal, é difícil amar quem não se conhece. Mas você pode muito bem se colocar no lugar do outro e amar a si mesmo. Digo “pode” porque também sei que tem gente que não se ama. Aí o problema é mais grave, torna-se algo patológico, doença.

Aqui opto por falar com aqueles que já se amam. Aos que ainda não descobriram este prazer – amar a si mesmo –, sugiro (de coração) que procurem ajuda. Para ajudá-los, há os psiquiatras para os mais céticos, há os líderes espirituais para os fervorosos. E há a opção dos dois para os inteligentes.

Aos que já se amam, no entanto, estimulo-os a amarem também ao próximo, a serem tolerantes com as diferenças. Se disserem “mas eu amo o próximo! ”, gentilmente os convido: amem mais! Não precisam ser rio violento que tudo arrasta; muito menos margens agressivas que comprimem o leito, o fluir gostoso da vida.

Se forem “rios”, que sejam belos, cristalinos de alma, que lavem o mundo que o circunda daquilo que é mau. Se forem “margens”, que sejam bondosas, acolhedoras, cheias de carinho, canteiros de safras férteis.

Espero, sinceramente, que esta seja uma das suas e das minhas perspectivas, apesar das nossas diversidades.

Ismael Alexandrino

*Este texto também pode ser lido na Revista Zelo, exatamente nesta página aqui.


Ao som de ‘Imagine’ – John Lennon
Degustando Chocolate Ferrero Rocher
Imagem: 'Cânion do Buracão' - Caetano Lacerda

terça-feira, 24 de novembro de 2009

Inquietude

Poesia
Negra dos fios lisos
Marrom da tez aveludada
Pretinha toda de alma.

Cheiro bom
Andar curtinho
Sorriso fácil.

Cândida! Doce.
Carioquinha de sangue
Funkeira atípica.

Ainda bem que Vinícius não a conhecera!
Certamente o Poetinha faria um gracejo,
Galanteador que era.

Velho Vinícius(Saravá!)...
Poeta bom, amigo de fé,
Mestre dos meus versos
Ensinou-me a admirá-la.

Obrigado, Poetinha, pelo espírito.
Obrigado, Baixinha, pela inspiração.

Que continue em meus versos, Pequena!
Faça-os – com o seu jeito peralta –
Levantar das estrofes
E andar num sábado à tarde e de mãos dadas
À beira daquele lago ao norte
Ou mesmo naquele Parque da Cidade ao sul.

Ismael Alexandrino


Ao som de 'Morena-Flor' - Vinícius de Moraes
Degustando Guaraná Antártica com Salame Italiano Picante
Imagem:'Garota de Ipanema' - Ingo Wilges

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Sobre o pensamento

Curtas


O pensamento é um vagão de trem bala sem maquinista.


Ismael Alexandrino




Ao som de 'Feel' - Robbie Williams
Degustando Morango com Leite Condensado

domingo, 18 de outubro de 2009

Poeminha confuso

Poesia

Ter sido é memória.
Vir a ser é angústia.
Ser é pretensa utopia.
Então estou?

Ismael Alexandrino


Ao som de 'Nessum Dorma' - Giacomo Puccini
Degustando vinho Brunello de Montalcino com Carpaccio

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Sobre ser Poeta

Curtas

Muitas pessoas não entendem o espírito do poeta. Ser poeta vai muito além de escrever poemas. O poeta é um ser que vive permanentemente em um estado alterado de espírito.

Ismael Alexandrino


Ao som de 'Feel' - Robbie Williams
Degustando Vinho Tinto Brunello di Montalcino

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Sobre a fraqueza humana

Curtas

Fraqueza: tu não tinhas nenhuma, eu tinha uma. Eu amava.

Bertolt Brecht¹


Ao som de 'Eu sei que vou te amar' - Vinícius de Moraes
Degustando Wafer de Chocolate

¹Eugen Berthold Friedrich Brecht foi um destacado dramaturgo, poeta e encenador alemão, faleceu em 14 de Agosto de 1956.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Conselho de amigo

Curtas

Decida racionalmente e viva emocionalmente.

David Vieira¹


Ao som de 'É preciso saber viver' - Titãs
Degustando I2 Hidrotônico

¹David Vieira, mais que amigo, um irmão. Empresário e economista, é um bon vivant e dono do site DaVaranda.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Sobre o seu tênis azul

Quando vi seu tênis azul escuro com bico branco, sorri. Lembrei da minha infância, meus amigos usavam uma marca chamada Bamba. Era a sensação da época, todos queriam ter um. Naquela época as preocupações eram amenas, do tipo se ganharia ou não um tênis novo no aniversário.


Hoje as preocupações são bem mais sérias. Mas prefiro me preocupar em observar o seu andar. Eu gostei do seu tênis azul escuro. É que o achei singelo. Sua cara: discreto, bonito, engraçado e tímido.


Ismael Alexandrino


Ao som de 'Léo e Bia' - Oswaldo Montenegro
Degustando Neston 3 Cereais da Nestlé

Alguns amigos

Escutei – não lembro onde, nem quando, e nem de quem – que amigo a gente não faz, mas sim os reconhece. Recentemente, reconheci mais um. Que bom que meu álbum tem crescido. Digo álbum porque amigos são como fotografias: para nos dar alegria, basta-nos vê-los, mesmo que rapidamente.

Rubem Alves, na sua sabedoria poética, diz que na companhia do amigo não se precisa conversar, a presença se basta. Há prazer no silêncio. Como me dou bem com o silêncio, amo meus amigos que às vezes me permitem a presença apenas, sem ter que, necessariamente, ficar conversando para preencher os hiatos de tempo e espaço.

Quando morei em Recife, reconheci bons amigos. Dois deles, no entanto, me fazem uma falta tremenda. Claro que os outros também fazem. Eu seria injusto se não reconhecesse a grandeza de suas amizades, dos seus afetos. Mas estes dois eram meus amigos no silêncio, nas imagens. Um deles pude ver no último final de semana. Mergulhamos juntos, com nossas respectivas companhias femininas. O outro, médico dedicado, ficou em São Paulo, o que agravou minha saudade.

Na Itália, principalmente em Bari, um dos meus bons amigos passava horas sem dar um "piu". E quando o fazia era prazeroso. Em Milão, nem tanto; meu colega de quarto tinha a necessidade de conversar. Difícil ser amigo de alguém que não se contenta com a presença, que precisa desesperadamente de falar o tempo todo.

Aos confrades, o apreço. Aos amigos, a estima. Aos irmãos, o carinho. Bons amigos são confrades, amigos e irmãos. Completos. Aos bons amigos, dedico meu apreço, estima e carinho.

Não sei bem porque comecei a escrever este texto. Talvez porque esteja sentindo realmente falta de alguns amigos que estão distantes. Sandro, David, Benhur, Diego, vocês fazem muita falta quando não estão por perto. Espero que estejam sempre bem, felizes, intensos nas suas aspirações cotidianas, do dia-a-dia. Pois neste dia reflexivo, saudoso, sou só saudade de cada um de vocês.

Ismael Alexandrino


Ao som de 'Intuição' - Oswaldo Montenegro
Degustando Ninho Soleil da Nestlé
Imagem: 'Olhando os Alpes Suíços' - Ismael Alexandrino



segunda-feira, 7 de setembro de 2009

A fotografia da letargia

Estou empoeirado. É como aquela laranjeira na beira da estrada de chão batido lá no sul do Pará. Os caminhões pesados, os carros possantes, as carroças pacienciosas, e os andarilhos: todos passam por mim, balançando meus galhos. Mesmo assim a poeira decanta em minha estrutura. Vai descendo por meus veios, cada sulco, cada proeminência, até aos giros.

Também há teias de aranha aqui e acolá. Nestas, por vezes, enrosca-se uma mariposa, uma libélula, ficando prisioneiras do meu estado, morrendo secas, empalhadas.

O verde, outrora brilhante, vivaz, passa despercebido. Uma árvore empoeirada não faz a mínima diferença. Constrange o cenário. Está ali. Apenas. De vez em quando balança com um vento mais forte, ou até mesmo uma batida de algum veículo. Mas não cai, não quebra, não morre. Melhor seria se morresse. Pararia de constranger o cenário e adubaria o solo. Solo árido, rachado. Não há gotas de chuva que possa irrigá-lo, nem lágrimas o umedece. Não há lágrimas. Bobagem pensar que uma laranjeira empoeirada derrame alguma lágrima. E os solidários transeuntes (imagino!) só choraram no dia em que nasceram. E olhe lá. Mais que desnutridos, são desidratados. Desnaturados. Sem vida.

Se olhos ainda os tivesse, talvez o espelho me desse alguma luz, mostrasse um caminho longínquo por detrás da silhueta. Mas a visão ficou embaçada, turva. Só há as imagens registradas noutros tempos. Sem novos registros, não há vida presente. O futuro, não diferente, está preso naqueles anos.

“Sou um presidiário cumprindo sentença”, — diria Vander Lee – grande amigo dos seus amigos –, numa de suas canções. Com a mesma – ou maior! – indiferença.

Quiçá um agricultor corte meus galhos, a seiva escorra, e cresça frondosamente. Talvez o Estado me derrube com uma de suas máquinas do progresso, asfaltando minha morada, petrificando o cenário.

E se nada disso acontecer, que o Deus milagroso me dê uma daquelas safras de dulcíssimos frutos para serem degustados pelas mocinhas que estão de dieta. Ou que, pelo menos, inspire um artista plástico a me pintar e me expor na próxima bienal. Mesmo que assim: empoeirado.

Ismael Alexandrino


Ao som de 'Sem Mandamentos' - Oswaldo Montenegro
Degustando Vinho Tinto Seco Duas Quintas
Imagem: '( D u s t )' - Diogo Gasparett'

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Sobre Deus

Crônica

Alguém disse que gosta das coisas que escrevo, mas não gosta do que penso sobre Deus. Não se aflijam. Nossos pensamentos sobre Deus não fazem a menor diferença. Nós nos afligimos com o que os outros pensam sobre nós. Pois que lhes digo que Deus não dá a mínima. Ele é como uma fonte de água cristalina. Através dos séculos os homens tem sujado essa fonte com seus malcheirosos excrementos intelectuais. Disseram que ele tem uma câmara de torturas chamada inferno onde coloca aqueles que lhe desobedecem, por toda a eternidade, e ri de felicidade contemplando o sofrimento sem remédio dos infelizes.


Disseram que ele tem prazer em ver o sofrimento dos homens, tanto assim que os homens, com medo, fazem as mais absurdas promessas de sofrimento e autoflagelação para obter o seu favor. Disseram que ele se compraz em ouvir repetições sem fim de rezas, como se ele tivesse memória fraca e a reza precisasse ser repetida constantemente para que ele não se esqueça. Em nome de Deus os que se julgavam possuidores das idéias certas fizeram morrer nas fogueiras milhares de pessoas.

Mas a fonte de água cristalina ignora as indignidades que os homens lhe fizeram. Continua a jorrar água cristalina, indiferente àquilo que os homens pensam dela. Você conhece a estória do galo que cantava para fazer nascer o sol? Pois havia um galo que julgava que o sol nascia porque ele cantava. Toda madrugada batia as asas e proclamava para todas as aves do galinheiro: “Vou cantar para fazer o sol nascer”. Ato contínuo subia no poleiro, cantava e ficava esperando. Aí o sol nascia. E ele então, orgulhos, disse: “Eu não disse?”. Aconteceu, entretanto, que num belo dia o galo dormiu demais, perdeu a hora. E quando ele acordou com as risadas das aves, o sol estava brilhando no céu. Foi então que ele aprendeu que o sol nascia de qualquer forma, quer ele cantasse, que não cantasse. A partir desse dia ele começou a dormir em paz, livre da terrível responsabilidade de fazer o sol nascer.

Pois é assim com Deus. Pelo menos é assim que Jesus o descreve. Deus faz o sol nascer sobre maus e bons, e a sua chuva descer sobre justos e injustos. Assim não fiquem aflitos com minhas idéias. Se eu canto não é para fazer nascer o sol. É porque sei que o sol vai nascer independentemente do meu canto. E nem se preocupem com suas idéias . Nossas idéias sobre Deus não fazem a mínima diferença para Ele. Fazem, sim, diferença para nós. Pessoas que tem idéias terríveis sobre Deus não conseguem dormir direito, são mais suscetíveis de ter infartos e são intolerantes. Pessoas que têm idéias mansas sobre Deus dormem melhor, o coração bate tranqüilo e são tolerantes.

Fui ver o mar. Gosto do mar quando a praia está vazia da perturbação humana, Nas tardes, de manhã cedo. A areia lisa, as ondas que quebram sem parar, a espuma, o horizonte sem fim. Que grande mistério é o mar! Que cenários fantásticos estão no seu fundo, longe dos olhos! Para sempre incognoscível! Pense no mar como uma metáfora de Deus. Se tiver dificuldades leia a Cecília Meirales, Mar Absoluto. Faz tempo que, para pensar sobre Deus, eu não leio teólogos; leio os poetas. Pense em Deus como um oceano de vida e bondade que nos cerca. Romain Rolland descrevia seu sentimento religioso como um “sentimento religioso”. Mas o mar, cheio de vida, é incontrolável. Algumas pessoas têm a ilusão que é possível engarrafar Deus. Quem tem Deus engarrafado tem o poder. Como na estória de Aladim e a lâmpada mágica. Nesse Deus eu não acredito. Não tenho respeito por um Deus que se deixa engarrafar. Prefiro o mistério do mar... Algumas pessoas não gostam do que penso sobre Deus porque elas deixam de acreditar que suas garrafas religiosas contenham Deus...

Rubem Alves


Ao som de 'Aria' - Johan Sebastian Bach
Degustando Vinho Tinto Reservado do Chile e Queijo Camembert
Imagem: 'O Iluminado' - Ismael Alexandrino

segunda-feira, 27 de julho de 2009

Sobre nossa consituição

Curta

"Nós somos do tecido de que são feitos os sonhos."

Shakespeare


Ao som do silêncio
Degustando Laranja

quinta-feira, 9 de julho de 2009

À beira do lago

Poesia


Na margem oeste do lago
O sol ofusca-me a visão,
Embaraço os pensamentos
No grande caleidoscópio.

Há peixes famintos neste lago
Há peixes gordos nessas águas
Há peixes que nem parecem ser
Há peixes comidos, deformados

E há algum encanto.

Só não vejo pontes.

Mergulho até leste?
Arrisco-me nas profundezas?
Contemplo de longe?
Espero a vazante secar o leito?
Dou as costas, volto para casa?

Em volta do meu aquário
De um peixe só
É bem mais fácil viver.

Ismael Alexandrino


Ao som de 'Sereia' - Lulu Santos
Degustando Source Perrier
Imagem: 'Ponte JK, Brasília' - Mendes

sexta-feira, 26 de junho de 2009

I'll be there

Música

You and I must make a pact,
we must bring salvation back
Where there is love, I'll be there

I'll reach out my hand to you,
I'll have faith in all you do
Just call my name and I'll be there

And I'll be there to comfort you
Build my world of dreams around you,
I'm so glad that I found you
I'll be there with a love that's strong
I'll be your strength, I'll keep holding on
(yes I will, yes I will)

Let me fill your heart with joy and laughter,
Togetherness is all I'm after
Whenever you need me, I'll be there
I'll be there to protect you,
With an unselfish love I'll respect you
Just call my name and I'll be there

If you should ever find someone new
I know she'd better be good to you
'Cos if she doesn't, I'll be there

(Don't you know, baby, yeah yeah)
I'll be there, I'll be there,
Just call my name, I'll be there

(Just look over your shoulders, honey - ooh)

I'll be there, I'll be there,
Whenever you need me, I'll be there...

Michael Jackson

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Você e eu temos de fazer um pacto,
Nós temos de trazer a salvação de volta.
Onde houver amor, eu estarei lá...

Eu estenderei minha mão para você,
Terei fé em tudo que você fizer,
Apenas chame meu nome e eu estarei lá...

E eu estarei lá para te confortar,
Para construir meu mundo de sonhos ao seu redor,
Estou tão contente por ter encontrado você...
Eu estarei lá com um amor que é forte,
Eu serei sua força, eu continuarei persistindo...
(sim, eu continuarei, sim, eu continuarei)

Deixe-me preencher seu coração com alegria e risos,
União é tudo que estou procurando.
Sempre que você precisar de mim, estarei lá...
Eu estarei lá para te proteger
Com um amor altruísta eu respeitarei você.
Apenas chame meu nome e eu estarei lá...

Se você encontrar um novo alguém,
Eu sei que é melhor que ela seja boazinha para você
Porque, se ela não for, eu estarei lá...

(Você não percebe, baby? Sim, sim)
Eu estarei lá, eu estarei lá,
Apenas chame meu nome, eu estarei lá...

(Apenas olhe por cima dos seus ombros, doçura...)

Eu estarei lá, eu estarei lá,
Sempre que você precisar de mim, eu estarei lá...

Michael Jackson


Ao som de 'I'll be there' - Michael Jackson
Degustando Coca-Cola
Imagem: 'Ila' - Pensamentos meus

domingo, 14 de junho de 2009

Conselho de amor

Poesia

Fica em silêncio,
Fica!
Fica bem quietinha
No seu canto
Direito

Da nossa cama
Estreita
Deitada aqui
No meu peito.

Ismael Alexandrino


Ao som de 'Sailing' - Rod Stewart
Degustando Bis
Imagem: 'A flor paquerando o broto' - Ismael Alexandrino

Nada

Crônica

Às vezes é mesmo nada. Somente melancolia e esperamos que as pessoas parem de perguntar “O que você tem?”, mas ninguém nunca acredita em “nada”. Às vezes é somente aquela saudade do que não foi, do tanto trabalhado para chegar a lugar nenhum, dos planos que deram para trás e dos que foram em frente, mas por caminhos inesperados. Às vezes é tudo, tão tudo que acaba sendo nada. É aquela sensação de flutuar numa nuvem cheia de pensamentos incompreensíveis que confundem suas intenções e apagam sua vontade. Às vezes é somente nada e a cada vez que nos perguntem “O que você tem?” vem essa obrigação de ser alguma coisa e mergulhamos em nós mesmos em busca de respostas que simplesmente não existem. Às vezes é somente nada.

Andréa Cuca¹


Ao som de 'Por você' - Frejat
Degustando Pão com Presunto
Imagem:'A garrafa que morreu na praia' - Ismael Alexandrino


¹Andréa Cuca é cronista, contista e blogueira.

sábado, 13 de junho de 2009

Detalhes do horizonte

Crônica


Ela desenha cenários no vazio. Mágica! Pensamento flutuante, sem habilidade para materializá-los, sonho-os. Poeta.

Haveria colinearidade nos traços de pensamento? Abcissas, ordenadas, catenárias distribuindo forças, dando formas, edificando. Interrogações, exclamações, reticências aliando forças, dando sentido, poetizando.

Cada qual com a sua arte, seguem vivendo mundos distintos, porém tão próximos. Mundo de construções, projetos; mundo de imagens, devaneios. De súbito, comenta-se que o dia é curto, o tempo urge. Pacificamente, percebe-se que o dia é suficiente para as prioridades.

Mas, e as insuficiências? Abstraio-as. Modifico a realidade, corro atrás do instante perdido, vasculho a memória, tento projetar. Não consigo. Só enxergo o hoje, o agora, este momento que já não existe mais. Fugacidade, efemeridade, tudo isso me circunda, tenta me abraçar. Perderei a vez, então? É isso que me resta?

Duvido muito. Duvido da história, dúvido deste seu futuro posto nesse papel quadriculado. Só não duvido de nós dois.

Ismael Alexandrino


Ao som de 'Que nem maré' - Zigo Aguiar
Degustando Coca-cola Gelada
Imagem: 'En la orilla' - Jose C. Lobato

quarta-feira, 3 de junho de 2009

Meu último Verso

Poesia

Nunca imaginei que engasgaria
Com meu próprio verso.
Meu mais belo verso.
O único
Perfeito
Verso.

Mas ele não desce
Constringe o peito
Fluído, reflui
Vaza olhos abaixo.
Olhos negros meus
Vazios, perdidos na escuridão
Sem rumo.
Diferentes dos brilhantes
Verde-azulados seus
Cheios, vivazes
Cheios de horizonte.

Sem forças para contrapor,
Desfaleço-me em meu leito vazio
Bege, vermelho e preto.

Lembrar do seu sorriso doce
Da sua tez alva e macia
Suas madeixas de carvão
Faz me brotar sorriso
Precordialgia
Pesar
Paixão
E sonhos.

Sonhos são importantes.
E ainda os tenho.
Adormecidos, deveras.
Intactos, no entanto.
Todos.
Tolos alguns, de fato.
Mas, meus. Seus. Nossos.

Inerte, não tenho mais versos.
Lúgubre verbo desconjugado no presente
Aquele presente raro se afastou de mim.

Meu Verso saltou da minha Poesia.

Ismael Alexandrino


Ao som de 'Mais uma vez' - Jota Quest
Degustando vácuo
Imagem: 'Lilás e azul' - Álbum de fotografia

segunda-feira, 25 de maio de 2009

Você é forte

Vídeo

domingo, 5 de abril de 2009

Alquimia naval

Crônica

Acabara de ressuscitar uma paciente, quando sou chamado pelo rádio no pátio do hospital. Meu irmão, também médico, noticia-me que eu havia sido convocado para servir a Marinha do Brasil. Sinceramente, não sabia o que lhe dizer. Não verdade, não tinha o que dizer. Secou-me os lábios, minha fronte espontaneamente abaixou. Silenciei-me.

Atento e disposto, fui recepcionado por semblantes carregados, com pouco humor, hostis até. “Disciplina e Hierarquia são a base da nossa organização” –, bradavam. Sempre fora extremamente disciplinado; sempre respeitara hierarquias. Minha adaptação seria tranqüila, pensei. Ledo engano! Queriam mais: queriam aprisionar o meu espírito num grande corpo, diferente do meu. Amante da arte de fazer viver, agora deveria me preparar para a guerra, onde a morte – paciente – espera os audazes. De Poeta da Vida a combatente de guerra, de médico a Oficial Militar. Meu espírito livre deveria se transformar em espírito de corpo, saltar num abismo desconhecido e se unir a outros que juraram, outrora, dar a própria vida pela Pátria. Mais que transcendência; uma transmutação.

A idéia de militarizar-me chocava com quaisquer aspirações pregressas. Não por alguma tendência rebelde (não as tenho), mas talvez pelo medo de me despir do indivíduo, de me robotizar, tornar-me apenas mais um oficial rígido de coração e cérebro petrificados, tão somente cumpridor de infindáveis normas, e que sobrevive do Estado e para o Estado.

A tempo, descobri que a rigidez mórbida do mastro de um navio comporta a maleabilidade plácida de uma flâmula. E a flâmula verde-loura tremulante, altiva, esta sim me arrepia, emociona-me, faz-me olhar para o alto, por cima dos ombros de gigantes, desejando seguir em frente. Por certo, ainda indivíduo, sonhador. Mas em um vibrante e simbiótico espírito de corpo, numa inegável e legítima alquimia naval.

Ismael Alexandrino


Ao som de 'Hino Nacional Brasileiro'
Degustando Café Bela
Imagem: 'Cisne Branco' - Calovi

domingo, 15 de fevereiro de 2009

Colônia de férias

Poesia

Há, e não tem quem negue,
Certa irritação em meu semblante.
"Donde vem?" –, perguntas.
Deste Estado, desta União.
Desta indecência democrática
Que me obriga a sentar por horas a fio
Diante de um hipócrita que tenta
Inculcar-me certa paixão.

Refuto-os! Todos!
Em silêncio, no entando sob
Pena de um sono no Bailéu.
"Disciplina e Hierarquia!" –, bradam.
"Palhaçada!" –, digo eu.
Teatro de fantoches mal treinados,
Soldadinhos de chumbo,
'João-Bobos' retardados.

Querem aprisionar o meu espírito
No que chamam "espírito de corpo".
Pois meu espírito, Senhores, rebelou-se;
Quer divagar fora do corpo
Por essas matas ao derredor,
Cansadas de serem pisadas por pés raivosos.

Desconfio, Confrades, que querem amarrar
O meu espírito numa farda passada com preciosismo.
Querem, por certo, matar minha paixão,
O encatamento que eclode em meu peito.

Não sou mais uma pessoa,
Apenas um Posto
Pelo qual alguns me cumprimentam
E a outros devo cumprimentar solenemente
E com corpo esguio.

Abandonei minha personalidade;
O genótipo tão carinhosamente
Dado por meus pais transformou-se
Em dois sapatos engraxados,
Meias limpas,
Uma calça com vincos,
Uma camisa social cheia de insígnas,
Uma camiseta alva segunda-pele,
E um chapéu cafona.
Desconhecia, enquanto simples cientista médico,
O poder destruidor dos genótipos.
Jurei, outrora, dar o melhor de mim
Para salvar vidas.
Era um sonho romântico, admito.
Um sonho nobre, sem quaisquer malícias.

Mas o novo que me tornei é forçado
A jurar dar a própria vida por uma instituição.
A vida perdera o valor!
Institucionalmente, agora sou treinado para matar.

Queria, de fato, poder matar idiossincrasias...
A fome, por exemplo, ...
As dores alheias.
Mas acabei matando
O amor, o encanto, a paixão.
E agora, Senhores, estou pronto
Para matar a vida que passa
E depois a mim.

"Qual o sentido?".
Desconheço!
"Qual a direção?"
Meia-volta, volver! – talvez.
Mas já é tarde, Senhores.
E só me resta caminhar
Para o leito de morte
Do espírito,
E do corpo.

Nuno Rossi


Ao som de 'Cálice' - Chico Buarque
Degustando Água com Biscoito Água e Sal
Imagem: 'Colônia de férias' - Stella Brasil