Café Alexandrino - O lado aromático da vida

segunda-feira, 6 de novembro de 2006

Breve retrato de dias sem cor

Crônica

Desde a semana passada, estou quase mudo, silente, sem cor. Em uns daqueles dias em que meus passos são para trás. Não sinto dores físicas, mas a tristeza aguda, que vezes em vezes teima em me acompanhar, sentou-se ao meu lado. Insisto para que vá embora. Ela resiste. Esses últimos dias não me fizeram nenhum sorriso de luz, nem de brisa; ando desde o amanhecer com essa dificuldade de respirar, ando mesmo desarmado, apenas com o ânimo necessário para, pelo menos, sobreviver. Confesso que são nessas horas que tenho vontade de devolver minha fé.

Sofro de indelicadezas que não me fizeram. E também das que me fizeram injustamente. Nenhuma visita me agradaria; ou melhor, apenas uma. Alegrar-me-ia bastante. Nesses recentes dias anuviados e tristonhos, amigo nenhum me faria falta. Que martírio inglorioso se precipita sobre mim! Faço perguntas. Quem me trouxe essas sensações de que, daqui por diante, momentos infelizes me aguardam? Não raro, ocorre-me uma resposta parcial: eu mesmo! Isso é preocupante e constrangedor. Como consigo ser trágico comigo mesmo algumas vezes!

Meu peito se oprime, nele habita uma dor que me acusa, que rasga minhas vísceras, que me mata psicologicamente. Tenho vontade de segurar meu coração, de protegê-lo. Verdade, não minto, incompreensivo leitor. Por acaso você já sentiu necessidade de ser menos humanista, mais hipócrita e por vezes incoerente? Se já sentiu, talvez compreenda o que está a ler, pois o preço da não-hipocrisia e da coerência é caro, caríssimo, sobretudo nos dias de hoje... Quiçá impagável. Confesso que nesses instantes penso em acompanhar o senso comum, em renunciar a alguns princípios e ideologias. Ou ao menos em conferir-lhes um significado tão pragmático e comum quanto simplório e pouco elogiável.

Sei exatamente do que falo. Ainda me restou lucidez para isso. Só não sei se é válido explicar a vocês, hoje indiferentes leitores, aquilo que provavelmente não entenderiam. No máximo, compreenderiam, no máximo. Por isso, dispenso os esclarecimentos. Nem queria redigir mesmo. Faço-o porque é uma das pouquíssimas maneiras pelas quais ainda me sinto vivo. Esses dias têm sido dolorosos; não pela dor física que agora não sinto, mas pelo "inexplicável" estranho que dentro de mim luta comigo, zomba de mim, entristece-me e me empalidece, e que, hoje, me venceu uma vez mais.

Tenho estado sem razões, sem motivos... Dizem, entretanto, que depois da tempestade vem a calmaria (bonança). Sei que isso é verdade. Só não sei se consigo esperá-la, sem gravames nem perdas irreparáveis.

Yuri Brandão


Ao som do Silêncio
Degustando Torta de Limão
Imagem: 'Tristeza' - Ruibebiano

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