Café Alexandrino - O lado aromático da vida

terça-feira, 25 de março de 2008

Baby Bundas

Artigo


"Querido(a)s amigo(a)s, eu sou Responsável. Mesmo que eu ainda não consiga evitar que o pior aconteça. Eu sou responsável pela minha atitude de indignação contra os inevitáveis males da vida. Eu posso escolher ficar sentado olhando a eterna tristeza dos Baby Bundas, ou eu posso escolher me levantar e viver a minha vida do jeito que eu acredito que tem que ser vivida."




Em algum momento entre 2008 e 2009, a economia dos EUA, Inglaterra e Rússia devem experimentar a pior recessão da sua história. Os economistas do primeiro mundo esperam uma desaceleração radical de todos os meios de produção em função da aposentadoria em massa dos Baby Boomers. O consumo deve cair drasticamente com dois terços dos Baby Boomers se aposentando até o final da década. 80% do melhor do consumo nos EUA, Inglaterra e Rússia é feito hoje pelos Baby Boomers que estão pendurando as chuteiras.

Para complicar o cenário, o alongamento da expectativa de vida das pessoas vai trazer grandes problemas para a vida dos boomers. Os seus pais estão vivendo mais, o que os obriga a sustentar os mais velhos e ainda sustentar os filhos que não se estabeleceram na vida. Estima-se que 67% dos Baby Boomers aposentados vão ficar sem dinheiro ainda em vida. A grande maioria dos Baby Boomers contam apenas com os seus imóveis como fonte de receita quando aposentados. Entretanto, a problemática imobiliária americana já desvalorizou as suas residências em 15%.

Baby Boomers é o termo usado para descrever a geração de pessoas que nasceram no Pós Segunda Grande Guerra entre 1946 e 1964 nos EUA, Inglaterra e Rússia. Foram eles os grandes responsáveis nas últimas três décadas pela consolidação do estilo de vida que a grande maioria das pessoas apreciam: casa, carro, televisão, família, restaurantes, shopping centers, clubes, entretenimento cultural e viagens de lazer.

Há anos se discute o impacto da aposentadoria dessa geração para o nosso futuro. Quem vai substituir os médicos, engenheiros, professores, advogado e arquitetos que estão se aposentando? Os americanos estão realmente preocupados com a questão. Para se ter uma idéia da importância desse assunto, uma busca básica no Google aponta 4.810.000 milhões de páginas sobre Baby Boommers.

O Brasil não está muito preocupado com esse assunto, mas deveria. Vai faltar gente para desempenhar as funções mais básicas da economia: fazer conta e escrever. A coisa vai ficar muito feia até 2010. Nesse momento a Catho está anunciando 2.578 vagas abertas para Engenheiros Civis, 1.451 para Engenheiros Eletrônicos, 2.209 para Engenheiros de Telecomunicações, 8.121 vagas para profissionais de educação, 5.794 para profissionais Financeiros, 14.611 para profissionais de informática e 3.308 para profissionais de logística e suprimentos.

Quem irá preencher essas vagas?

E quantas novas vagas poderiam ser criadas se tivéssemos cérebros adicionais para criar planos de negócios sólidos?

Para cada novo cérebro que soubesse fazer planos de negócios, teríamos 100 novos postos de trabalho, diretos ou indiretos. Para cada novo cérebro que soubesse executar um plano de negócios, teríamos 200 novos postos de trabalho.

Mas, quem irá preencher essas vagas?

Quem? Quem?

Os Baby Boomers tem muitos fãs e críticos ferrenhos. De um lado dizem que os Boomers são os grandes responsáveis pela expansão dos nossos direitos individuais. A causa feminista, os direitos dos homosexuais, os direitos civis, os direitos dos deficientes físicos são algumas das conquistas dessa geração. Além disso, a criação da televisão, a proliferação do rádio e das mídias revistas e jornais permitiram que o indivíduo passasse a ter maior controle sobre a informação que recebe. Por outro lado, os Boomers são acusados de ignorar o futuro e pensar apenas no seu bem estar individual. Investiu-se pesado na construção de fábricas, cidades e carros, deixou-se de lado o meio ambiente.

Quem critica os Baby Boomers são os líderes das gerações que vieram depois, as chamadas Gerações X e Geração Y. Muito provavelmente a sua ou a minha geração.

A Geração X é marcada pela falta de otimismo, cinismo e apatia política no status quo. Os Xs acreditam em Deus, são abertos a todo tipo de religião, mas não seguem nenhuma. A Geração X é caracterizada pela forte tendência ao empreendedorismo fora da caixa. Os Xs criaram a internet, os movimentos de Anti-Globalização e Meio Ambiente. Faz parte da Geração X quem nasceu entre 1964 e 1975.

A Geração Y é sobre quem nasceu entre 1976 e 1994. É a geração dos "sem teto"; não conseguem arrumar um bom emprego que pague o aluguel de um apartamento próprio. É a geração que precisa do dinheiro dos pais Baby Boomers para viver. Entretanto, são geralmente filhos de pais separados, por isso dependem de um ambiente social sadio no escritório para compensar a perda doméstica.

Eles cresceram com a informação na mão, eles têm computador, celulares, messengers, blogs, iPods e toda a tralha da vida moderna. Eles têm tudo, acham que sabem tudo, mas ainda não são nada, nem fizeram nada de realmente relevante com o que sabem.

E pior, estão dispostos a perpetuar tudo que sabem que está errado.

Eu chamo essa geração de Baby Bundas.

Eu chamo de Baby Bundas todos aqueles que têm a informação na mão mas não sabem o que fazer com ela. Não sabem por onde começar e muito menos onde quer terminar.

O Baby Bunda sabe que usar crachá corporativo é ridículo, mas não vêem a hora de pendurar o crachá de diretor da empresa no pescoço para desfilar na hora do almoço; eles sabem que ter carro corporativo é sacanagem com os estagiários que andam de ônibus, mas não vêem a hora de botar as mãos no novo Corolla 2009; eles sabem que chefe com sala grande é uma grande injustiça com os funcionários que têm que trabalhar apertados em micro cubículos sem privacidade, mas não vêem a hora de virarem chefes para ocupar a sala panorâmica com vista para a Berrini ou Paulista; eles sabem que demitir as pessoas pela idade, cor da pele, e origem é puro preconceito, mas não vêem a hora de ter o poder na mão para contratar mulher gostosa, os amigos da faculdade e mudar o escritório para a rua da badalação; eles sabem que corrupção é um dos maiores males da humanidade, mas não vêem a hora de meter a mão no cartão corporativo da empresa para levar cliente para a casa da luz vermelha.

O Baby Bunda é um cego cerebral. O Baby Bunda acredita em regras mesmo quando não as fez; acredita em harmonia mesmo quando não a tem; acredita em certezas mesmo quando nada está claro. Baby Bunda acredita em hierarquias, organogramas, status, popularidade e legado.

Baby Boomers, Geração X e Geração Y talvez não tenham nada a ver com o Brasil. A nossa geração de Boomers não lutou no Vietnã nem muito menos assistiu ao assassinato de um grande líder carismático como JFK e Martin Luther King. Pelo contrário, os Boomers brasileiros se calaram durante a ditadura militar. Eles aproveitaram o momento para fazer o pé de meia, levar um pedaço do pau brasil. A nossa geração X tá comprando agora o primeiro computador, montando agora as suas próprias empresas por falta de opção, se divorciando em igual proporção. A nossa geração Y, bem, a nossa geração Y está bebendo nesse exato momento uma Kaiser, ou tomando uma Brahma na Zeca Hora (Eu nunca vi tanta menina de dezoito anos gorda como agora), atualizando o profile na Orkut, postando comentários em alguns blogs, ou despedaçando o carro do pai no poste da esquina.

Será que existe alguma geração de brasileiros pela qual podemos nos orgulhar?

Eu espero que sim.

Nada menos que isso interessa!

QUEBRA TUDO! Foi para isso que eu vim! E Você?

Ricardo Jordão Magalhães¹, Caçador de Baby Bundas


Ao som de 'Bienal' - Zeca Baleiro
Degustando Lambrusco di Modena
Imagem: 'Völlig überbewertet ...' - Hamburger Jung

Ricardo Jordão Magalhães¹ é consultor de marketing e palestrante, criador e gestor do site BizRevolution.

sexta-feira, 21 de março de 2008

Sobre saber onde quer chegar

Curtas



Luzes no meio do túnel só existem para quem sabe aonde pisa.

Ismael Alexandrino


Ao som de 'Chão de Giz' - Oswaldo Montenegro
Degustando Espumone
Imagem: 'Corredor da Galeria Vittorio Emanuele II' - Ismael Alexandrino

quinta-feira, 20 de março de 2008

Sala de embarque

Crônica

Nem parece que há pouco mais de seis horas eu estava em outro continente. David, Manu e Benhur me ligaram se dispondo a me deixar no aeroporto em Recife, e estavam mesmo lá. Mas tia Jazeel passaria mais cedo que eles lá em casa. Flávio sairia tarde do trabalho, não chegaria a tempo. Rodrigo bem que tentou, mas o trânsito também o impedira de chegar antes do meu embarque. Mamãe, meus irmãos, e meu amor me ligaram do centro do país me desejando uma boa viagem. Em todos eles percebi certa labilidade emocional, e uma nostalgia na voz ou no semblante.

Viajar para outro país – independente do motivo e do tempo em que vai ficar – causa anseio em quem vai, receio em quem fica. Imagino que a ansiedade e o receio moram no desconhecido. Mas, e na distância, o que mora? Na distância mora a saudade.

E na saudade...Ah!, na saudade... Na saudade mora o amor. Não que não exista amor quando não há saudade, mas é que quando se está perto e não há saudade, parece que o amor fica dormindo. Aquele sentimento bem completo com facetas incontáveis, quando se está perto, dá chance às suas pequenas partes que o constitui aparecerem. Então se percebe o carinho, o zelo, a dedicação, o olhar singelo, a compreensão, o companheirismo. Mas tudo isso intensifica quando há distância, quando há saudade. E aí o amor pulsa, arrebenta o peito como lava de um vulcão incandescente.

Viajar para outro continente – independente do motivo e do tempo em que vai ficar – causa uma dose ainda maior de anseio em quem vai, e mais receio ainda em quem fica. Como serão os costumes? Como a cultura se manifesta? E o aspecto financeiro com as conversões incessantes de moeda? A comida? O transporte? O idioma? E os novos amigos, eles existirão? A cabeça fervilha buscando obedecer ao plano inicial; o coração tenta desacelerar e achar seu ritmo original.

Aqui em Lisboa, onde aguardo uma conexão para o meu destino final daqui a aproximadamente uma hora e meia, aproveito para escrever esta crônica. Está um frio discreto, cerca de dez graus centígrados. O clima ameno me convida a mais uma dose de café quente. Aceito o convite, mesmo sabendo que a cafeína de tal bebida acelerará um pouco mais meu coração ansioso, com certo receio, com muito amor, e cheio de saudade.

Almoçarei em Milão. Certamente, um paraíso gastronômico. Fã que sou da culinária italiana, não tenho quaisquer dúvidas de que meu paladar será saciado. Mas imagino que quanto melhor a companhia, mais saborosa se torna a comida. Lembro-me da palavra “comunhão”, que significa “comer junto”. Comer junto de alguém que se ama deixa a comida mais gostosa. O contrário, comer junto de alguém que não se gosta, tira o sabor das guloseimas. E comer sozinho não chega a ser um destempero, mas falta o toque final que dá o sabor refinado. Como estou longe de todo mundo que amo, imagino que o almoço será gostoso por ele mesmo, mas sem adicionais que possam lhe apurar o sabor.

A voz de timbre metálico anuncia que meu vôo não terá atraso. Olho para o lado à procura de um pão de queijo feito na hora antes de embarcar. Não encontro. E novamente me vêm lembranças. Que saudades do café da manhã que minha mãe prepara cheios de quitutes caseiros preparados com amor! Ah!, o amor... o amor mora nas lembranças; o amor mora na saudade.

Ismael Alexandrino, Lisboa


Ao som de 'Chega de saudades' - Vinícius de Moraes
Degustando Café Expresso
Imagem: 'Sobrevoando Turim' - Ismael Alexandrino

segunda-feira, 17 de março de 2008

DDI

Crônica
Uma ligação de looonga distância:

— Alô?

— Eu queria falar com o serviço de atendimento ao consumidor.
— Pois não.


Minutos depois:


— Serviço de atendimento ao consumidor, Deus falando.

— Deus?
— Sim...
— Nossa, o Senhor, assim...
— Qual é a surpresa, minha filha? Você fala Comigo todo dia.
— Mas o Senhor não responde...

— Isso é o que você pensa. O que você precisa, minha filha?
— Deus, sabe o que é? O Senhor me mandou um filho diferente do que eu pedi.
— Tem certeza, minha filha?
— Olha Deus, eu pedi um modelo luxo e o Senhor me mandou um STD?

— Porque você acha isso, minha filha?

— Eu queria que ele fosse inteligente, calmo, educado... Ele não é nada disso.

— Minha filha, quando ele saiu daqui ele era tudo isso, você é que andou estragando ele.

— Não sei Deus, eu tenho que ensinar tudo para ele, como pode ser inteligente?

— Ele aprende rápido, repara minha filha. Aprende até o que você não ensina. Aprende com suas atitudes.

— Deus, o certificado de garantia esta ilegível, e no lugar do proprietário, não tem meu nome e nem o do pai.

— Filha, você não é a dona dele, você é mais do que isso: é a mãe! Você está cuidando de um filho Meu, que será entregue ao mundo para realizar boas obras.

— Deus, estão faltando páginas no manual de instrução.

— Como assim, minha filha?

— Dúvidas mais freqüentes, como agir em determinadas situações, o que quer dizer cada tipo de choro... Essas coisas.

— Minha filha, há páginas que só uma mãe pode preencher. Cada ser humano é único, e às vezes um desconhecido para si próprio, então essas páginas podem jamais ser preenchidas; mas com amor, todas as páginas serão preenchidas, pois é esta a única tinta capaz de escrever neste manual. Cabe a você escolher o caminho a tomar.
— Quanto tempo eu tenho de garantia?

— Posso garantir a você, que ele ficará ao seu lado o tempo necessário, tempo este que você nunca achará suficiente. Posso lhe garantir também que você estará sempre ao lado dele, embora muitas vezes não aprove suas atitudes. Se você, verdadeiramente, aprender a ser mãe, estará ao lado dele, para ampará-lo e corrigi-lo. Assim você estará escrevendo mais uma página do manual.

— Deus, eu não tenho mais tempo para mim, ele toma tudo, ocupa todos os espaços. Eu nem me reconheço mais.
— Você não se reconhece em cada vitória de seu filho? Você não reconhece, cada minuto do tempo empregado? Se ele estiver lhe dando muito trabalho, posso trazê-lo de volta.
— ...

— Você quer isso?
— Não, não Deus, eu acho que não sei mais viver sem ele!

— Deus, eu queria me preparar, será que o Senhor pode me dizer qual a pior tarefa, a qual, uma mãe pode ser incumbida?

— Àquelas, para as quais, ela não esteja preparada. Minha filha, Eu lhe dei o filho que você Me pediu. Um filho perfeito é aquele que você ama, seja ele como for. Toda mãe tem filhos perfeitos, porque a perfeição está nos olhos de quem vê e no coração de quem pede. Vai, mãe, cuida do teu filho, vive um dia de cada vez, aprende o que o dia te ensina. Não procure o manual, não busque garantias. Ame, assim você encontrará todas as normas e conhecerá todas as garantias.
— Deus, muito obrigada, se eu precisar posso...

— Pode, minha filha, todas as vezes que você precisar.
A ligação é encerrada.

São Pedro anuncia outra ligação, e desconsolado pergunta:

— Elas não aprendem?

No que Deus, responde muito pacientemente:


— Elas já sabem, querem apenas a confirmação.
— Confirmação de quê? – pergunta São Pedro, atônito.

Deus, olha, dá uma risadinha e diz:


— Que têm o filho perfeito.


Gláucia Taricano¹



Ao som de 'Ai ai ai' - Vanessa da Mata
Degustando Chá de Maçã Gelado
Imagem: 'Enquanto passa o trem' - Ismael Alexandrino

Gláucia Taricano¹
amiga que muito estimo é mãe em tempo integral, blogueira de mão cheia, dona do blog "Mãe 24h".

domingo, 9 de março de 2008

Bruma

Miniconto


É tarde. Cedo para se despedir com um adeus. E sofro. Clamo por uma história real. Vivo um sonho. A vida é um inferno? A eternidade é o céu? Talvez o seja; mas o presente também é eterno! E o céu de hoje, onde está? Não o vejo. Densas nuvens tentam assustar-me. Ignoro-as. Ressentidas, molham-me. Lavo-me da fuligem infernal.

É cedo. Tarde demais! Já não a vejo do lado. Corro para a porta trancada. Esqueci-me que a janela não tem trancas. O vento frio certamente aquecera seu corpo mais que eu. Matreiro, levou-a para longe de mim. Ressinto-me. Choro.

Já é hora. Levanto-me indisposto para o trabalho. Prefiro o ócio nostálgico do meu cachimbo. Demito-me por telepatia. Não saio de casa; cansei de viver lá fora. Preciso viver o interior do interior do interior, onde a morte – paciente – dorme. Que horas a morte acordará? Depois das oito, imagino. Mas oito décadas me serão suficientes? Talvez. Apresso-me, no entanto, em dizer que te amo.


Ismael Alexandrino, Milão



Ao som de 'Desafinado' - Tom Jobim

Degustando Capuccino

Imagem:'Cartão Postal - Bruma' - Ismael Alexandrino