Café Alexandrino - O lado aromático da vida

segunda-feira, 6 de agosto de 2007

Porque eu gosto da “igreja universal”!

Crônica


Século XXI, época de inovações tecnológicas e de constantes avanços no âmbito do conhecimento. Período de amplo desenvolvimento industrial e de estudos que procuram explicar, passo a passo, o galgar gradativo do homem sobre a Terra. Geômetras, filósofos, teólogos, lingüistas, antropólogos, físicos, biólogos, gente de toda sorte em busca de respostas iminentes para os problemas universais. Ao mesmo tempo, há os que buscam saídas insólitas e desprovidas de quaisquer atributos de seriedade e decência para as dificuldades inerentes ao homem contemporâneo – a mim e a você, caro leitor! E por essa razão transformam-se em verdadeiros “gurus”, detentores de “fórmulas mágicas”, supostamente capazes de solucionar as maiores intempéries humanas.

Bell, em 1876, cria o primeiro telefone de que se tem notícia; Edson, que ao longo da vida registrou 1033 patentes, criou, pelos idos de 1879, aquela que se tornaria sua mais popular descoberta, a lâmpada elétrica; Dumont, depois de muitas tentativas, conseguiu, no início do século passado, decolar com seu 14 Bis, e é considerado por boa parte da comunidade científica internacional o inventor do avião. Como eles, é grande o número dos que ainda hoje se detêm em experiências científicas, estando sempre à procura de algo, sob o impulso da inspiração, banhada pela transpiração do laborioso e digno ofício.

Infelizmente, na passagem diacrônica dos séculos, sempre houve aqueles que pretenderam burlar o bom senso acadêmico e deturpar a razão com subterfúgios insustentáveis. Para esses insensatos, não há, geralmente, compromisso com a verdade ou com a lisura dos fatos. O mundo religioso que o diga.

Os povos pré-cristãos já conviviam com a figura dos charlatões, que exploravam a fé ingênua do povo, vendendo poções mágicas e miraculosos elixires. Também nessa linha, velhos filmes de faroeste comumente mostram protótipos desses espertalhões anunciando garrafadas, que são verdadeiras panacéias para todos os males do corpo e, às vezes, também da alma. O próprio Jesus convidou a ter especial atenção com os “falsos profetas”.

Mas o que ultimamente tem chamado minha atenção, de fato, é a criatividade e a ousadia sem limites de algumas seitas cristãs ditas neo-pentecostais, como é o caso da igreja universal do reino de Deus, criada no final dos anos 70 pelo Pastor Edir Macedo – que se autonomeou bispo.

Embora não mais estejamos no período neolítico, em diversos momentos, parece que o tempo retrocedeu e nos mandou de volta a um passado do qual não são boas as lembranças. Não obstante a presença de filósofos e pensadores de diversas linhas teóricas, ou de profetas e sábios guardiões dos ensinamentos divinos, os primeiros séculos revelam-se repletos de casos de comportamentos primitivistas, calcados em deturpações morais e sociais, muitas vezes geradas pela falta de letramento e visão de mundo da população.

É para esse contexto arcaico da vida humana que me sinto enviado quando me deparo com os programas televisivos da igreja universal. Em um misto de humor e indignação, assisto perplexo ao caos religioso para o qual a sociedade moderna vai se encaminhando. Há um bom tempo, as reflexões deixaram de ser evangélicas ou catequéticas e passaram a visar unicamente ao enriquecimento mágico e alucinante – “sinal de benção”. Os recursos pecuniários tomam a cena e os versículos bíblicos vêm, com velocidade assombrosa, perdendo espaço para os cifrões. É a santa, fraterna e salvífica pobreza cristã sendo engolida pela voraz idéia de prosperidade a todo custo.

Por falar nisso, vale a pena entender de que se trata essa tal de teologia da prosperidade, mola mestra nas falas dos discípulos do bispo Macedo. Trata-se de uma substituição do Evangelho da Graça, pelo “evangelho” da ganância. Oral Roberts, um dos principais pregadores dessa heresia, chegou a escrever um livro intitulado How i learned Jesus Was Not Poor (“Como aprendi que Jesus não foi pobre”). É comum ouvirmos da boca dos pregadores da prosperidade frases do tipo: “Você é filho do Rei, não tem por que levar uma vida derrotada.” A princípio, uma frase dessas pode até parecer justa, mas o que muitos talvez não saibam é que, para esses pregadores, “vida derrotada” = ser pobre, ter dificuldades financeiras, ficar doente etc. Dias atrás, ouvi apresentadores macedianos afirmarem que o apóstolo Paulo jamais esteve doente. Pensei: será que eles se basearam em alguma passagem das cartas escritas pelo apóstolo? Quem sabe no seguinte trecho:

“E vós sabeis que vos preguei o evangelho a primeira vez por causa de uma enfermidade física. E, posto que a minha enfermidade na carne vos foi uma tentação, contudo, não me revelastes desprezo nem desgosto; antes, me recebestes como anjo de Deus, como o próprio Cristo Jesus”.(Gal.4.13,14).

É, acho que não!

São estes, portanto, os princípios norteadores da teologia da prosperidade: a riqueza, a saúde intocável, a juventude eterna, o luxo a qualquer custo, qualquer mesmo! Daí atraírem tantos adeptos. O povo, na verdade, muitas vezes carente e abalado emocionalmente, desistiu de sonhar com Jesus, de caminhar com ele; vale o que vier primeiro. O que primeiro oferecer uma rosa santa, um cajado iluminado, uma tocha milagrosa, uma pulseira do poder, um sabonete para lavar todos os males e “descarregar encostos” – seja lá o que for isso – ou qualquer outra bugiganga dessas da igreja universal.

Mas, enfim, por que acabei gostando deles? Por reconhecer, caro leitor, que eles já não se envergonham mais de desprezar a Cruz de Cristo. São pessoas honestas em suas propostas, que as anunciam bem claramente em canais abertos de rádio e tevê para quem quiser ver e ouvir, como eu. Não se acanham diante da cretinice explícita e desenfreada. É bonito ver como ainda existem pessoas de coragem, prontas a defenderem seus ideais (sobretudo quando rendem milhões).

Se já gostava, passei a gostar ainda mais quando descobri que também faço parte da grande nação dos 318, tão propagada pelos queridos amigos. É que um colega observou que a placa do meu carro é 0318. Que bom! Também sou da nação dos abençoados!

Deus nos salve!

Eduardo Sampaio1


Ao som de 'Castelo forte' - Martinho Lutero
Degustando Curaçao com Carpaccio de Salmão
Imagem:'La Promesse' - René Magritte


Eduardo Sampaio1 é lingüísta e professor de língua portuguesa em Alagoas.

5 comentários:

Anônimo disse...

Panetone,dê aula preguiçoso

Anônimo disse...

Muito pertinente esse texto. Coisa de profissional da escrita. Você começa a ler e quando menos imagina já terminou a leitura. Isso é coisa de textos bem escritos. Mais uma vez, parabéns!

Anônimo disse...

Eduardo, gostei muito do seu texto. Sempre com fundamentos as afirmações. Parabéns! Isso aí é tudo verdade mesmo. Muuuuuuuuito bom! Nota 10.

Anônimo disse...

concordo com o anônimo!!!!!!!!!!!!!

Anônimo disse...

Como diria Edir Macedo: "Templo é dinheiro"