Café Alexandrino - O lado aromático da vida

sexta-feira, 9 de dezembro de 2005

A passarela

Conto


E eu tomei coragem e resolvi aparecer para ele. A noite estava fria e aproveitei para colocar o meu casaco de couro preto, que muito lembrava o que ele tinha me dado. A maquiagem sutil como a gosto dele, o batom com brilho, os cabelos soltos e o meu andar com um salto pequeno que realçava minhas curvas. Diante do espelho do restaurante eu estava pronta. Há dez anos eu não me sentia tão decidida.

Saí do banheiro. Do corredor fiz uma passarela e caprichei no sorriso, mas quando estava no meio do caminho o rosto surpreso dele não refletia nenhum sentimento de afeição. Depois disso cada passo me fraturava a alma, mas o meu sorriso se manteve incólume. Sem duvidar mudei de direção e continuei com os olhos fixos mirando a porta de saída. No carro desfaleci por duas horas entre os vidros escuros. E aquele pranto fora o desfecho de dez anos de espera , preparação e coragem.

Hoje posso falar e sorrir do momento. Não me arrependo de ter arriscado tantos anos da minha vida por um amor que não sei porque não deu certo. Amanhã vai fazer um ano daquele encontro que não houve e eu estarei bem longe daquele restaurante - que abandonei naquela noite - como já estou daquela vida (onze anos de renúncia).

Agora o casaco me esquenta do frio artificial aqui dentro do avião. A minha alma com trezentos e cinco pontos já está bem costurada para agüentar um novo vôo (onde somente o destino é antigo). Boa noite, por favor apertem os cintos, pois já vamos partir.

João Antonio Ribeiro

Ao som de 'Eu te amo' - Chico Buarque
Degustando Café Carioca
Posted by PicasaImagem:'Sem rumo' - Daniel Costa

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